Art. 6 — Se a lei da natureza pode ser abolida do coração do homem.

No que concerne ao sexto artigo, assim se procede. Parece que a lei da natureza pode ser abolida do coração do homem. 

1. – Pois, sobre Romanos: “para os gentios, que não têm a lei…”, diz a glosa: “no homem interior, renovado pela graça, inscreve-se a lei da justiça, que a culpa apagara”. Ora, a lei da justiça é lei da natureza. Portanto, a lei da natureza pode apagar-se. 

2. Demais – Além disso, a lei da graça é mais eficaz que a lei da natureza. Ora, a lei da graça é apagada pela culpa. Portanto, muito mais pode apagar-se a lei da natureza. 

3. Demais – Além disso, aquilo que a lei estatui é estabelecido como justo. Ora, muito foi estatuído pelos homens contra a lei da natureza. Portanto, a lei da natureza pode abolir-se do coração do homem. 

Em sentido contrário, há o que diz Agostinho: “A tua lei está escrita no coração do homem e nenhuma iniquidade pode apagá-la”. Ora, a lei inscrita no coração dos homens é a lei natural. Portanto, a lei natural não pode ser apagada. 

SOLUÇÃO. — Deve dizer-se que, como acima se disse, pertencem primeiro à lei natural certos preceitos generalíssimos, os quais são conhecidos por todos; além disso, há outros preceitos secundários mais particulares, que são como que conclusões próximas dos princípios. Assim, quanto a tais princípios comuns, a lei natural de nenhum modo pode ser abolida do coração humano de forma universal. É abolida, porém, em algo de operável, na medida em que a razão é impedida de aplicar o princípio geral ao operável particular por óbice da concupiscência ou de alguma outra paixão, como se disse acima. Quanto aos preceitos segundos, entretanto, pode ser a lei natural abolida dos corações dos homens, ou por força das más persuasões, do mesmo modo que, no especulativo, ocorrem erros a respeito das conclusões necessárias, ou ainda por causa dos maus costumes e hábitos corruptos. Dessa forma, por 

exemplo, entre alguns não eram os latrocínios reputados pecados e também os vícios contra a natureza, como o diz o Apóstolo em Romanos. 

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — No que concerne ao primeiro argumento, deve dizer-se que a culpa abole a lei da natureza no particular, não no universal, a não ser talvez quanto aos preceitos segundos da lei da natureza. 

RESPOSTA À SEGUNDA. — No que concerne ao segundo argumento, deve dizer-se que, embora a graça seja mais eficaz do que a natureza, a natureza é mais essencial ao homem e, por isso, dotada de maior permanência. 

RESPOSTA À TERCEIRA. — No que concerne ao terceiro argumento, deve dizer-se que aquela razão procede quanto a preceitos segundos da lei da natureza, contra os quais alguns legisladores produziram alguns estatutos iníquos.