Do Novus Ordo Missae à intercomunhão ecumênica

Postado em 02-05-2018

Pe. João Batista de A. Prado Ferraz Costa

Segundo um boletim da Sala de Imprensa do Vaticano publicado há poucos dias, amanhã, dia 3 de maio, a cúpula da Congregação para a Doutrina da Fé, sob a supervisão do papa Francisco I, se reunirá com um grupo de bispos alemães para resolver a controvérsia em torno da “intercomunhão”, isto é, a possibilidade de um cônjuge protestante, no caso de matrimônio misto, receber a comunhão na missa católica (novus ordo ou, quem sabe, na missa Ecclesia Dei Adflicta), em certas ocasiões.

A referida medida “pastoral” foi aprovada por ampla maioria do episcopado alemão; uma minoria que ainda conserva um senso da fé católica pediu à Santa Sé que decidisse a questão, entendendo que não se trata de assunto de natureza pastoral, mas está em jogo a doutrina católica sobre a santa missa, o dogma da transubstanciação, o sacerdócio hierárquico. É inútil dizer que na cúpula de amanhã no Vaticano estarão presentes somente os bispos que aprovam a comunhão ecumênica. Tudo indica que o trabalho será encontrar uma receita de apaziguamento dos ânimos.

Abstração feita de tudo aquilo que qualquer católico medianamente instruído sabe a respeito da disciplina tradicional sobre a comunhão (a necessidade de não ter a consciência agravada por um pecado mortal, o disposto no Código de Direito Canônico, Cânon 855, “Arcendi sunt ab Eucharistia publice indigni, quales sunt excomunicati, interdicti etc – sejam afastados da Eucaristia os publicamente indignos, quais são os excomungados, os interditos etc), o fato é que se pode dizer  que a comunhão ecumênica defendida pela Conferência Episcopal Alemã está realmente em harmonia com a nova eclesiologia do Vaticano II (Lumen gentium) que, dizendo que a Igreja de Cristo subsiste na Igreja Católica, acaba pondo a Igreja Católica em pé de igualdade com todas as “denominações” cristãs, favorecendo um pan-cristianismo e gerando uma nova concepção de comunhão eclesial. No final das contas, o que importa não é ser católico, ou protestante ou ortodoxo, mas ser “irmão em Cristo”, visto que todos subsistimos na Igreja de Cristo. Não importa como cada um entenda o mistério eucarístico. O que importa é querer partilhar  o pão, que assim se reduz a símbolo do espírito de fraternidade universal proposto por Jesus. Não é à toa que o cardeal Walter Kasper defendeu a intercomunhão dizendo que a maioria dos católicos recebe a comunhão sem saber o que é transubstanciação. ( O ilustre purpurado desenvolveu o argumento da ignorância teológica para defender sua heresia!)

De modo que, realmente, a comunhão ecumênica é mais um fruto do Vaticano II, que os ditos católicos conservadores tanto defendem. É uma contradição os conservadores não quererem aceitar a intercomunhão, como também criticarem Amoris laetitia, que está perfeitamente na linha da nova moral conjugal que nega a hierarquia de fins do matrimônio (cf. Gaudium et spes)

A comunhão ecumênica representa também um fruto  da reforma litúrgica. Com efeito, como se sabe, o missal de Paulo VI foi inventado para agradar aos “irmãos separados”, os quais participaram, como peritos no assunto, nos trabalhos de redação do novus ordo missae.  E o famoso protestante Max Thurian, da comunidade de Taizé, declarou: “Um dos frutos do novo ordo será talvez que as comunidades não católicas poderão celebrar a santa ceia com as mesmas orações da Igreja católica. Teologicamente é possível.”

Ao novo e falso ecumenismo do Vaticano II (que já tinha sido condenado por Pio XI em Mortalium animos) soma-se a visão historicista hoje dominante entre os teólogos, a qual diz que toda a teologia tradicional que adota os conceitos de matéria e forma para explicar os sacramentos não passa de uma construção histórica resultante da influência do aristotelismo, de maneira que se pode inovar a teologia dos sacramentos e haver uma nova explicação do sacramento da eucaristia.

A tudo isto acresce o fato de que, por detrás da reformismo litúrgico e disciplinar, está a maçonaria muito interessada em instrumentalizá-lo para propagar seu ideal de uma nova religião mundial que una a humanidade em uma vaga espiritualidade humanista.

Que dizer de uma avalancha tão devastadora sobre toda a Igreja em sua doutrina imutável e em sua disciplina multissecular? Certamente trata-se de um castigo do céu. Deus não abandonou a sua Igreja; simplesmente castiga-nos por nossos pecados.

Por um lado, não causa surpresa o que faz e diz Francisco I, com grande apoio dos seus correlegionários do Partido Modernista Alemão, da imensa maioria dos católicos dopados pelo sentimentalismo e da grande mídia. Tudo quanto ele tem feito era previsível e estava mais ou menos implícito nos documentos do Vaticano II, nas reformas de Paulo VI, João Paulo II e Bento XVI. Por outro lado, causa espanto a cegueira dos chamados conservadores que se mostram incapazes de ver as raízes ideológicas do pontificado de Francisco no Concílio Vaticano II, o qual Francisco tem levado às suas últimas consequências.

Entretanto, o que é certo é que se Deus permite tamanha devastação em sua vinha é porque saberá de tanto mal tirar um bem maior. Devemos estar preparados para restarmos como um pequeno rebanho que dá testemunho de fé em um mundo que realmente apostatou de Deus. Há, contudo, sinais de esperança; cresce, por exemplo, o número de católicos simples, que sem ter a pretensão de ser intelectuais defensores do conservadorismo liberal ianque, têm tomado consciência das verdadeiras causas da crise da Igreja e passam a assistir à missa de sempre e a lutar pelo Reinado Social de Cristo sem se iludir mais com a democracia. É um bom sinal.

 

Anápolis, 2 de maio de 2018.

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