Art. 7 ― Se o pecado se divide acertadamente em pecado por pensamentos, palavras e obras.

O sétimo discute-se assim. ― Parece que o pecado não se divide acertadamente em pecado por pensamentos, palavras e obras.

1. ― Pois, Agostinho1 estabelece três graus de pecado. O primeiro, quando o sentido carnal é atraído por alguma sedução, e é o pecado de pensamento; o segundo, quando nos contentamos com o só deleite do pensamento; o terceiro, quando o consentimento estatui o que devemos fazer. Ora, estes três graus respeitam o pecado de pensamento. Logo, não é acertado considerá-lo como um gênero de pecado.

2. Demais. ― Gregório2 distingue quatro graus do pecado. O primeiro é a culpa latente no coração; o segundo, a sua manifestação externa; o terceiro, quando é corroborada pelo costume; o quarto, quando chegamos até a presunção da divina misericórdia, ou ao desespero. Ora, nestes quatro graus não se distingue o pecado por obras do por palavras e acrescentam-se dois outros graus. Logo, a primeira divisão não é acertada.

3. Demais. ― Não pode haver pecado por palavras ou obras, antes de haver o de intenção. Logo, tais pecados não diferem especificamente, e portanto não se devem dividir uns por oposição aos outros.

Mas, em contrário, diz Jerônimo3: São três os delitos gerais a que está sujeito o gênero humano, pois pecamos por pensamento, palavras ou obras.

SOLUÇÃO. ― Dois seres podem diferir especificamente de dois modos. Ou por constituírem ambos uma espécie completa, e assim o cavalo e o boi diferem especificamente. Ou porque, numa geração ou movimento, consideram-se espécies diversas, em graus diversos. Assim, a edificação é a produção completa da casa; ao passo que a colocação dos fundamentos e a ereção das paredes são espécies incompletas, como claramente se vê no Filósofo4. E o mesmo se pode dizer da geração dos animais.

Assim, pois essa tríplice divisão dos pecados por pensamentos, palavras e obras, ― não constitui espécies completas diversas; porquanto, sendo a obra a consumação do pecado, o pecado por obra é o que encerra a espécie completa. Mas, a primeira incoação dele é-lhe como a base, no pensamento; o seu segundo grau é constituído pela palavra, enquanto prorrompemos facilmente na manifestação do conceito pensado; o terceiro grau, por fim, está na consumação da obra. Por onde, esses três pecados diferem segundo graus diversos. É porém claro que pertencem a uma mesma espécie perfeita de pecado, como procedentes do mesmo motivo. Assim, o iracundo, ardendo pela vindita, turba-se-lhe primeiro o pensamento; depois, prorrompe em palavras contumeliosas; e, em terceiro lugar, chega aos fatos injuriosos. E o mesmo se dá com a luxúria e com qualquer outro pecado.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ― Todo pecado de pensamento é por essência oculto. E por isto, considera-se um só grau, distinto, contudo, em três outros, a saber: o pensamento, o prazer e o consentimento.

RESPOSTA À SEGUNDA. ― Os pecados por palavra e por obra convêm na manifestação, e por isso Gregório os compreende no mesmo grau. Jerônimo porém os distingue, porque no pecado por palavras só a manifestação é a principalmente intencionada; ao passo que o pecado por obra, o é principalmente o complemento do conceito interior da mente, sendo a manifestação uma conseqüência. Quanto ao costume e ao desespero, são graus conseqüentes à espécie perfeita do pecado, assim como a adolescência e a juventude, ao desenvolvimento perfeito do homem.

RESPOSTA À TERCEIRA. ― Os pecados por pensamento e por palavras não se distinguem do pecado por obras, quando coexistentes com este; mas entre si se distinguem quando existentes isoladamente. Assim como uma parte do movimento não se distingue da sua totalidade, quando o movimento é contínuo, mas só quando pára no meio.
1. XII De Trinit., cap. XII.
2. IV Moral. (cap. XXVII).
3. Super Ezech. (XLIII, 23).
4. X Ethic. (lect. V).