Art. 10 ― Se a grandeza da pessoa que peca agrava o pecado.

(Infra, q. 89, a. 3; De Malo, q. 7, a. 10, a. 5; Ad Hebr., cap. X, lect. III)

O décimo discute-se assim. ― Parece que a grandeza da pessoa que peca não agrava o pecado.

1. ― Pois, o que sobretudo nos engrandece é a nossa união com Deus, conforme aquilo da Escritura (Ecle 15, 13): Que grande é aquele que acha a sabedoria e a ciência! Porém com tudo isso não tem vantagem sobre aquele que teme o Senhor. Ora, quanto mais nos unimos a Deus tanto menos se nos imputa um ato como pecado; pois, diz ainda a Escritura (2 Pr 30, 18): O Senhor que é bom será propício para todos os que buscam de todo o seu coração o Senhor Deus de seus pais, e ele lhes não imputará nenhuma falta de não estarem bem purificados. Logo, o pecado não é agravado pela grandeza da pessoa do pecador.

2. Demais. ― Não há para com Deus acepção de pessoas, como diz o Apóstolo (Rm 2, 11). Logo, por um mesmo pecado, não pune mais um, que outro. Logo, não se agrava o pecado pela grandeza da pessoa do pecador.

3. Demais. ― Ninguém deve sofrer incômodo pelo bem que possui. Ora, sofrê-lo-ia se, por isso, mais se lhe imputasse em ato culposo. Logo, pela grandeza da pessoa que peca não se agrava o pecado.

Mas, em contrário, diz Isidoro: Conhecemos que o pecado é tanto maior quanto maior é considerada a pessoa que peca1.

SOLUÇÃO. ― Há dupla espécie de pecados. ― Uns nascem em nós sub-repticiamente, assim os radicados na debilidade da nossa natureza. E estes menos se imputam a quem tem maior virtude, porque se descuida menos de os reprimir, embora livrar-se deles completamente não o permita a nossa natureza enferma. Outros porém procedem da deliberação anterior. E estes tanto mais são imputáveis a uma pessoa quanto maior lhe for a grandeza. E isto pode dar-se por quatro razões. Primeira, porque os maiores, como os mais eminentes pela ciência e pela virtude, podem resistir mais facilmente ao pecado. E por isso o Senhor diz (Lc 13, 47): àquele servo que soube a vontade de seu senhor, e não se apercebeu, dar-se-lhe-ão muitos açoites. ―A segunda é a ingratidão; porque todo bem que nos engrandece é benefício de Deus, a quem somos ingratos, pecando. E a esta luz qualquer grandeza, mesmo de bens temporais, agrava o pecado, conforme aquilo da Escritura (Sb 6, 7): os poderosos serão poderosamente atormentados. ―A terceira se funda na repugnância entre o ato do pecado e a grandeza da pessoa; assim, se violar a justiça o príncipe, que dela deve ser o guarda; e se fornicar o sacerdote, votado à castidade. ― A quarta, no exemplo ou escândalo; pois, como diz Gregório2, o exemplo aumenta veementemente a culpa, quando o pecador é honrado por causa da reverência ao seu grau. E também os pecados dos grandes chegam ao conhecimento de muitos, que os suportam com maior indignação.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ― A autoridade aduzida se refere ao que praticamos com negligência, pela sub-reptícia debilidade da nossa natureza.

RESPOSTA À SEGUNDA. ― Deus não faz acepção de pessoas se pune mais as maiores; pois, a grandeza delas aumenta a gravidade dos pecados, como já dissemos.

RESPOSTA À TERCEIRA. ― O homem de grande posição não sofre pelo bem que tem, mas, pelo mau uso do mesmo.
1. II De Summo Bono (sentent., cap. XVIII).
2. Pastorali (part 1, cap. II).