Art. 4 – Se devemos orar só a Deus.

O quarto discute–se assim. – Parece que devemos orar só a Deus.

1. – Pois, a oração é, como se disse, um ato de religião. Ora, só a Deus devemos cultuar com o ato de religião. Logo, só a Deus devemos orar.

2. Demais. – Fazemos uma oração vã a quem não nó–la pode conhecer. Ora, só Deus pode conhecer a oração, quer por ela se exprimir quase sempre por um ato interno, que só Deus conhece, mais do que pela palavra, conforme aquilo do Apóstolo – Orarei com o espírito) crerei também com a mente; quer também porque, como diz Agostinho. não sabem os mortos, mesmo santos, o que fazem os vivos, mesmo se forem seus filhos. Logo, não devemos fazer oração senão a Deus.

3. Demais. – Se fazemos oração a certos santos, só o poderá ser por estarem eles unidos a Deus. Ora, certos, ainda vivendo neste mundo, ou estando no purgatório, estão muito unidos a Deus pela graça. Ora, a esses não fazemos oração. Logo, nem devemos fazê–la aos santos do Paraíso.

Mas, em contrário, a Escritura: Chama, se há alguém que te responde e volta–te para alguns dos santos.

SOLUÇÃO. – De dois modos fazemos oração a alguém: para que esse mesmo a defira, ou para que obtenha de outrem o que queremos. Ora, do primeiro modo só a Deus oramos, porque todas as “nossas orações devem ordenar–se à consecução da graça e da glória, que só Deus dá, conforme aquilo da Escritura: O Senhor dará a graça e a glória. Mas, do segundo modo, fazemos oração aos santos anjos e aos homens. não para que, por meio deles, Deus conheça as nossas petições, mas para que, pelas preces e pelos méritos deles, as nossas orações surtam o seu efeito. Por isso, diz a Escritura, que subiu o fumo dos perfumes das orações dos santos da mão do anjo diante de Deus. O que também é claro pelo modo mesmo de orar da Igreja. Assim, pedimos à Santa Trindade que se compadeça de nós; mas, aos santos, quaisquer que sejam que orem por nós.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – Nas nossas orações só aqueles prestamos o culto da religião, de quem queremos obter o que pedimos; pois, desse modo, o proclamamos o Autor dos nosso bens. Mas, não, aos que pedimos como a intercessores nossos juntos de Deus.

RESPOSTA À SEGUNDA. – Os mortos, se lhes considerarmos a condição natural não conhecem o que se passa neste mundo e, sobretudo, os movimentos internos do coração. Mas aos bem–aventurados, como diz Gregório, se lhes manifesta no Verbo o que devem conhecer do que se passa conosco mesmo quanto aos movimentos internos do coração. E, sobretudo convém à excelência deles conhecerem os pedidos que lhes fazemos vocal ou mentalmente. Por onde, os pedidos que lhes dirigimos eles os conhecem pelos manifestar Deus.

RESPOSTA À TERCEIRA. – Os que estão neste mundo ou no purgatório ainda não gozam da visão do Verbo para poderem conhecer o que pensamos ou dizemos. Por isso não lhes imploramos os sufrágios nas nossas orações; mas, enquanto vivos, pedimos–lhes, falando com eles.