Art. 3 ─ Se se enumeram convenientemente as obras satisfatórias, quando se diz que são três: a esmola, o jejum e a oração.

O terceiro discute-se assim. ─ Parece que não se enumeram convenientemente as obras satisfatórias, quando se diz que são três: a esmola, o jejum e a oração.

1 ─ Pois, uma obra satisfatória deve ser penal. Ora, nenhuma oração supõe qualquer pena pois é remédio contra a tristeza da pena ─ mas sim o prazer. Por isso diz a Escritura: Está triste algum de vós? Ore. Esta alegre? Cante Louvores a Deus. Logo não deve a oração ser computada entre as obras satisfatórias.

2. Demais. ─ Todo pecado ou é carnal ou espiritual. Ora, como diz Jerônimo, o jejum cura as doenças do corpo; a oração, os da alma. Logo, não há necessidade de nenhuma outra obra satisfatória.

3. Demais. ─ A satisfação é necessária para a purificação dos pecados. Ora, a esmola purifica de todos os pecados, na expressão do Evangelho: Dai esmola e eis aí que todas as coisas vos ficam limpas. Logo, as outras duas obras são supérfluas.

Mas, em contrário. ─ Parece que devem ser várias.

1. ─ Pois, os contrários se curam. Ora, muito mais que três são os gêneros dos pecados. Logo devem-se contar várias obras satisfatórias.

2. Demais. ─ Também se impõem, como satisfação as peregrinações e as disciplinas ou flagelações, que não estão na enumeração supra. Logo, essa enumeração é incompleta.

SOLUÇÃO. ─ A satisfação deve ser tal que nos prive de alguma causa, para glória de Deus. Ora, nós não temos senão três espécies de bens: os do corpo, os da alma e os da fortuna ou externos. Da parte dos bens da fortuna nos privamos pela esmola; e da parte dos bens do corpo, pelo jejum. Quanto aos bens da alma, não é necessário que essencialmente nos privemos deles em nada, ou que soframos qualquer diminuição dos mesmos, pois, por eles tornamo-nos aceitos de Deus; mas basta que os subordinemos totalmente a Deus. E isto fazemos pela oração. Também a enumeração referida se funda em que a satisfação extirpa as causas dos pecados. Pois, as raízes dos pecados são três, conforme o Evangelho: concupiscência da carne, concupiscência dos olhos e soberba da vida. Contra a concupiscência da carne se ordena o jejum; contra a dos olhos, a esmola; contra a soberba da vida, a oração, como ensina Agostinho.

Também é boa a enumeração supra quanto a consistir a satisfação em não permitir a entrada à sugestão dos pecados. Porque todo pecado ou o cometemos contra Deus, e a isso se ordena a oração; ou contra o próximo, e contra ele se ordena a esmola; ou contra nós mesmos ao que se ordena o jejum.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ Segundo certos há duas espécies de oração. Uma, dos contemplativos, cuja conversação está nos céus; e essa, totalmente deleitável, não é satisfatória. Outra, a que derrama gemidos pelos pecados, e essa implica uma pena e faz parte da satisfação. ─ Ou diremos e melhor, que qualquer oração constitui obra satisfatória porque, embora tenha a suavidade do espírito, tem contudo a mortificação da carne. Pois, como diz Gregório, à medida que se fortifica em nós o amor íntimo, enfraquece sem dúvida o poder da carne. Por isso, também, como lemos na Escritura, o nervo da coxa de Jacob secou na luta com o Anjo.

RESPOSTA À SEGUNDA. ─ O pecado carnal é susceptível de duplo sentido. Num, é o que se consuma na deleitação mesma da carne, como a gula e a luxúria. Noutro, o que se perfaz no que se ordena para a carne, embora não consista no prazer carnal, mas no da alma, como a avareza. Por isso tais pecados são como o meio termo entre os espirituais e os carnais. Por onde, há de corresponder-lhes alguma satisfação própria, a saber, a esmola.

RESPOSTA À TERCEIRA. ─ Embora cada uma das três obras enumeradas se aproprie, por uma certa conveniência, a cada pecado, por ser congruente que pelas coisas em que alguém peca, por essas seja também atormentado, e que pela satisfação seja arrancada a raiz do pecado cometido, contudo qualquer das obras enumeradas pode satisfazer por qualquer pecado. Por isso, quem não puder praticar uma dessas obras, se lhe imponha outra e sobretudo a esmola, que pode fazer às vezes das outras, enquanto as outras obras satisfatórias de certo modo as compramos com a esmola, nas pessoas a quem as damos. Mas não é por a esmola purificar de todos os pecados que serão supérfluas as outras satisfações.

RESPOSTA À QUARTA. ─ Embora haja especificamente muitos pecados, contudo vêm a se reduzir todos a essas três raízes ou a esses três gêneros deles, aos quais dissemos corresponderem as referidas satisfações.

RESPOSTA À QUINTA. ─ Tudo o que mortifica o corpo vem a cair no jejum; e tudo o que aplicamos a utilidade do próximo, se inclui na esmola; e semelhantemente, todo culto de latria prestado a Deus assume a natureza da oração. Por onde, também uma mesma obra pode ser satisfatória por várias razões.