Art. 2 ─ Se os santos que estão na glória são susceptíveis de penitência.

O segundo discute-se assim. ─ Parece que os santos que estão na glória não são susceptíveis de penitência.

1. ─ Pois, diz Gregório: Os bem aventurados recordam-se dos pecados, assim como quando estamos sãos e sem dores nos recordamos das dores. Ora, a penitência é a dor do coração. Logo, os bem aventurados na pátria não são susceptíveis de penitência.

2. Demais. ─ Os santos na pátria se conformam com Cristo. Ora, Cristo não era susceptível de penitência, por que não o era da fé que é o princípio da penitência. Logo, os santos na pátria também não são susceptíveis de penitência.

3. Demais. ─ Vão é o hábito que não se reduz ao ato. Ora, os santos na pátria não farão penitência de nenhum ato, porque então teriam algum desejo contrariado. Logo, não haverá neles o hábito da penitência. Mas, em contrário. ─ A penitência faz parte da justiça. Ora, a justiça é perpétua e imortal e permanecerá na pátria. Logo, também a penitência.

4. Demais. ─ Nas Vidas dos Padres se lê ter dito um deles, que o próprio Abraão se penitenciara por não ter feito mais bem. Ora devemos nos penitenciar, antes, do mal cometido que do bem omitido, ao qual não estávamos obrigados – pois, desse bem é que se trata. Logo haverá no céu penitência pelos males cometidos.

SOLUÇÃO. ─ As virtudes cardeais continuarão a existir na pátria, mas como atos cujo fim já foi atingido. Por onde, sendo a virtude da penitência parte da justiça, que é uma virtude cardeal, quem quer que tenha o hábito da penitência nesta vida te-lo-á também na futura; mas não praticará o mesmo ato que então praticava, senão outro, isto é, o de dar graças a Deus pela misericórdia com que perdoou os pecados.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ A autoridade citada prova que não praticam o mesmo ato que é, nesta vida, o da penitência. E isso o concedemos.

RESPOSTA À SEGUNDA. ─ Cristo não podia pecar. Por isso não lhe cabia a matéria desta virtude, nem em ato nem em potência. E por isso não há semelhança entre ele e os demais.

RESPOSTA À TERCEIRA. ─ Fazer penitência, propriamente falando, enquanto significa o ato da penitência como nesta vida o praticamos, tal não haverá na pátria. Nem por isso contudo o hábito dela terá sido vão, porque lhe corresponderá outro ato.

A quarta concedemos.

Mas, como a quinta objeção diz, que na pátria o ato de penitência será o mesmo desta vida, por isso respondamos à quinta. ─ A nossa vontade na pátria será absolutamente conforme com a vontade de Deus. Por onde, como Deus, por uma vontade antecedente, quer que todas as coisas sejam boas, e por consequência não quer nenhum mal, não o querendo porém por uma vontade consequente, o mesmo se dá com os bem aventurados. E essa vontade é impropriamente chamada penitência pelo referido santo Padre.