Art. 2 ─ Se pode haver matrimônio quando alguém consente em casar com uma mulher por causa desonesta.

O segundo discute-se assim. ─ Parece que não pode haver matrimônio quando alguém consente em casar com uma mulher por causa desonesta.

1. Pois, cada coisa tem a sua razão de ser. Ora, o matrimônio é um sacramento. Logo, não pode ser feito com a intenção de outro fim senão de aquele pelo qual foi instituído por Deus, a saber, a procriação da prole.

2. Demais. ─ A união matrimonial vem de Deus, como está claro no Evangelho. O que Deus uniu o homem não separe. Ora, uma união feita com fim desonesto não vem de Deus. Logo, não é matrimônio.

3 . Demais. ─ Os outros sacramentos não são válidos se não se observar o ato da Igreja. Ora, no sacramento do matrimônio a intenção da Igreja não é nenhum fim desonesto. Logo, o matrimônio contraído por uma causa desonesta não será verdadeiro casamento.

4. Demais. ─ Segundo Boécio, o que tende para um bom fim também é bom. Ora, o matrimônio é sempre um bem. Logo, não será matrimônio quando contraído em vista de um mau fim.

5. Demais. ─ O matrimônio significa a união entre Cristo e a Igreja. Ora, não pode haver aí nenhuma desonestidade. Logo, nem o matrimônio pode ser contraído por uma causa desonesta.

Mas, em contrário, quem batiza com a intenção de ganhar dinheiro verdadeiramente batiza. Logo, quem contrai matrimônio com uma mulher com essa mesma intenção, contrai um verdadeiro matrimônio.

2. Demais. ─ Isso mesmo o provam os exemplos e as autoridades citadas pelo Mestre.

SOLUÇÃO. ─ A causa final do matrimônio pode ser apreciada a dupla luz: essencial e acidentalmente. Essencialmente, a causa do matrimônio é aquela para qual ele é ordenado; e essa ─ procriar a prole e evitar a fornicação ─ é sempre boa. Quanto à causa acidental, pode ser a que os nubentes tinham em vista quando o contraíram. Ora, o que buscam no matrimônio não pode ser senão o que dele resulta; e além disso, não é a causa a modificada pelos efeitos, mas ao inverso. Por onde, bondade ou a malícia do matrimônio não resultarão do fim acidental, que os cônjuges se propuseram, mas estes é que serão bons ou maus, por terem feito desse fim o fim essencial do casamento. E como as causas acidentais são infinitas, por isso pode haver infinitas causas acidentais no matrimônio, umas honestas e outras desonestas.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ O princípio alegado é verdadeiro quando se trata de uma causa essencial e principal. Mas o que tem um fim essencial e principal pode ter vários fins secundários essenciais e infinitos acidentais.

RESPOSTA À SEGUNDA. ─ A união conjugal pode ser entendida pela relação mesma resultante do matrimônio, a qual é sempre boa e procedente de Deus, seja qual for a sua causa. ─ Ou pelo ato dos que se casam; e então pode ser má e não procedente de Deus, absolutamente falando, nem repugna que um efeito provenha de Deus embora tenha uma causa má, como no caso de filhos adulterinos; pois tal efeito não provém da sua causa como sendo má, mas por ser parcialmente boa, enquanto dependente de Deus; embora dele não proceda, absolutamente falando.

RESPOSTA À TERCEIRA. ─ A intenção da Igreja, de ministrar o sacramento, é necessária à validade de qualquer deles, de modo que não havendo intenção, não haverá sacramento. Mas a intenção da Igreja, quando tem em vista a vantagem resultante do sacramento, se refere à exata administração dele e não à sua validade. Por isso, não observadas as formalidades externas, nem por isso deixa ele de ser válido. Mas quem se omitir peca; assim quem, ao administrar o batismo, não tivesse em intenção a purificação da alma, que a Igreja tem em vista. Do mesmo modo, quem tem a intenção de contrair o matrimônio, embora não o ordene ao fim que a Igreja tem em vista, nem por isso deixa de realmente contrai-lo.

RESPOSTA À QUARTA. ─ O mal intencionado, não é o fim do matrimônio, mas dos contraentes.

RESPOSTA À QUINTA. ─ Essa união mesma é sinal da união entre Cristo e a Igreja e não obra dos que se unem. Por isso a objeção não colhe.