Uma bênção para o relaxamento dos costumes

Postado em 19-12-2023

Pe. João Batista de A. Prado Ferraz Costa

São incalculáveis as consequências ruins da recente Declaração do Vaticano Fiducia supplicans que autoriza a bênção dos casais homossexuais e dos recasados em situação irregular diante da lei de Deus e da Igreja. Fiducia supplicans só veio  favorecer o relaxamento dos costumes, aumentar a corrupção doutrinária e a confusão entre os católicos. Representa uma grave imprudência pastoral, resultante de desvios doutrinários  emanados do Vaticano II.

Devo dizer que absolutamente não me convenceram da licitude e oportunidade de tal bênção as distinções, regras e condições estabelecidas pela Declaração Fiducia supplicans emitida pelo Dicastério da Doutrina da Fé e aprovada pelo papa Francisco. Se se tratasse de uma coisa honesta, não haveria razão para que a bênção só pudesse ser dada em privado. Soa uma hipocrisia tal regra. Com efeito, não adiantou nada o documento estabelecer que a bênção não pode ser dada por ocasião da celebração de um casamento civil a fim de não causar escândalo e confusão entre os fieis. Ora, na verdade, o papa Francisco já aprovou e abençoou a união civil homossexual quando repetidas vezes declarou que defende a  proposta de o Estado fazer uma lei  que assegure o direito dos gays a ter suas uniões amparadas pelo ordenamento jurídico.

Ademais, a nota assinada há alguns anos atrás pelo cardeal Ladaria, então prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, que dizia que não era possível abençoar as uniões homossexuais porque as bênçãos estão ordenadas à administração dos sacramentos e à vida da graça e a união homossexual não é um matrimônio sacramental, reconhecia que a união homossexual tem elementos positivos.

Para mim, está claro que a Declaração Fiducia supplicans é mais um fruto podre do Vaticano II, decorrente da doutrina modernista da Gaudium et spes, que não reafirma a doutrina tradicional sobre a hierarquia de fins do matrimônio. Não havendo tal hierarquia de fins, a união homossexual poderia, ao menos, ser tolerada ou poder-se-ia mesmo ver, nela, elementos positivos porque realiza de alguma forma o fim do auxílio mútuo posto em pé de igualdade com o fim primário do bem da prole.

Tenho muita pena dos pais católicos que vivem o drama de ter um filho ou uma filha homossexual vivendo uma relação sodomítica e tentam convencê-los a deixar a vida de pecado. Que argumentos poderão apresentar a seus filhos quando o Vaticano diz que eles podem pedir a seu pároco uma bênção para sua união?

Tenho também refletido muito sobre a luz que o Antigo Testamento lança sobre a agonia da Igreja em nossos dias. Como se sabe, a sinagoga do Antigo Testamento é uma figura da Igreja Católica. A sinagoga, então depositária da Revelação Divina, tinha de gozar de uma assistência especial do céu para garantir a integridade da fé, tinha de gozar de certa infalibilidade para impedir o sincretismo com as religiões pagãs que cercavam o povo de Deus. Entretanto, quantos sacerdotes do Antigo Testamento foram prevaricadores e levaram o povo de Israel à apostasia, a começar pelo sacerdote Aarão que fez adorar o bezerro de ouro, e mais tarde, na época dos Macabeus, quando o paganismo dominou o templo de Jerusalém, que era o Vaticano àquela altura, que assistência do céu não houve para que a verdadeira religião não perecesse? Tudo isso tem me feito pensar que é preciso reconsiderar muito do que foi dito pelos teólogos sobre a infalibilidade do papa, para que entendamos melhor a indefectibilidade da Igreja e não incorramos no erro do sedevacantismo que a põe num beco sem saída.

A assistência do Espírito Santo prometida ao sucessor de Pedro é tão misteriosa que nenhuma explicação dos teólogos me satisfaz mais. Parece-me algo semelhante à assistência que Deus dispensava à sinagoga para preservar a Revelação Divina. É preciso restringir bastante a infalibilidade pontifícia, coisa que o próprio papa Pio IX se encarregou de fazer quando escreveu aos bispos da Alemanha instruindo-os sobre a resposta que deviam dar a Bismarck que acusava o papa de ter pretendido ser um deus na terra pior que todos os tiranos da Antiguidade.

Lendo De romano pontifice de São Roberto Belarmino, que tenta refutar as acusações dos protestantes contra os erros dos papas do passado, cheguei à conclusão de que de fato o Espírito Santo não exime o papa completamente de cometer erros contra a fé. Por exemplo, o caso do papa Estêvão VII, que mandou reordenar os padres e bispos ordenados e consagrados por seu predecessor papa Formoso. Os protestantes diziam que o papa tinha agido contra a doutrina da Igreja. São Roberto Belarmino tenta explicar o erro de Estêvão VII dizendo que ele não tinha negado a doutrina da Igreja mas agido mal por ódio de seu predecessor Formoso que era seu inimigo. Mas o fato é que o Espírito Santo não tinha garantido uma assistência suficiente para impedir que Estêvão  ofendesse a doutrina da Igreja. Igualmente hoje o Espírito Santo não garante a Francisco uma assistência suficiente para o impedir de, movido por sua simpatia pela  ideologia dos direitos humanos e do ecologismo, favorecer a agenda LGTB e promover o culto da pachamama.

Em conclusão destas considerações desejaria dizer três coisas.

  1. Exorto os pais católicos a permanecer vigilantes na educação de seus filhos. Ressaltem a importância do Decálogo, especialmente o 4 e o 6 mandamentos para a formação do caráter de seus filhos.
  2. Aos padres que porventura venham a ser obrigados por seus bispos a dar tal bênção estabelecida por Fiducia supplicans, em tal caso, deem a bênção do incenso: Ab illo benedicaris in cujus honore cremaberis. D. Pestana me dizia que às vezes tinha vontade de dar a bênção do incenso a certas pessoas que se dirigiam a ele.
  3. Quanto ao papa Francisco, realmente me parece que se tem comportado como o sacerdote Aarão, de modo que  aplico a seu caso o que disse Santo Ambrósio sobre a conduta de Aarão no episódio da adoração do bezerro de ouro: Nem podemos somente desculpar o sacerdote, nem nos atrevemos a condenar. “Neque excusare tantum sacerdotem possumos, neque condemnare audemus”.  Não sou sedevacantista. Espero a hora de Deus.

Rainha das Vitórias, debeladora das heresias, rogai por nós.

Anápolis,  19 de dezembro de 2023.