Arquivo de janeiro de 2013

A conquista da América e a Igreja

Postado por Admin.Capela em 31/jan/2013 - Sem Comentários

Outro dia um amável leitor do site Santa Maria das Vitórias perguntou-me se possuía algum material bom sobre o tema da catequese dos índios no período colonial porque tinha tido uma contenda com uma professora de História de uma universidade federal. Sua mestra dirigira uma arenga baseada na legenda negra deblaterando contra a Igreja, acusando-a de coautora de um verdadeiro genocídio, etc. É um realejo volta e meia acionado para impressionar os incautos. O ditador Hugo Chávez pretendeu que o papa Bento XVI pedisse perdão pelos crimes cometidos contra os indígenas durante a evangelização da América.

O aluno, inteligente, não suportou calado tanta asneira, ignorância e falsidade. Argumentou bem, conforme me disse. No entanto, queria reunir maiores  informações a respeito.

Embora não seja historiador, proponho-me  fornecer algumas informações sobre o descobrimento da América e a catequese dos índios que poderão ser úteis aos católicos que amam a Igreja, não toleram vê-la denegrida e prezam a verdade histórica. Há dezesseis anos defendi uma dissertação com o título O Padre Antonio Vieira e a defesa dos índios no Brasil. Raízes bíblicas e patrísticas de sua argumentação através de seus sermões e cartas. Na ocasião, tive de estudar um pouco o aspecto histórico do tema, orientado por um professor da Universidade Gregoriana, pesquisando na biblioteca da referida universidade, na Casa Generalícia da Companhia de Jesus e no Centro Português de Cultura em Roma.

Parece-me que a primeira coisa que é preciso dizer a respeito é que a descoberta da América constituiu, sim, um problema de consciência para a cristandade, ao menos para a parte sã da cristandade que vivia sob o influxo da escolástica e da reforma tridentina. Logo após o descobrimento da América, a Igreja pronunciou-se, prevendo o perigo de abusos e injustiças cometidos por cristãos no novo continente. O papa Alexandre VI e os reis da Espanha  preocuparam-se em mandar para América homens de bem, de vida coerente com a fé, a fim de converter os aborígines. Alberto  Caturelli, em Il nuovo Mondo Riscoperto, comenta: “O papa sabe perfeitamente, como o sabem os reis e todos os cristãos, que frequentemente não fazemos o que desejaríamos mas aquilo que aborrecemos, que o bem que amamos não o fazemos e o mal que não amamos é justamente o que fazemos (Rom. 7, 15-19).

Em suma, para compreender a história da conquista da América, cumpre ter uma visão realista das coisas. Não se pode, por um lado, pensar, como os românticos, que os  indíginas fossem todos puros e inocentes, pacíficos e amigos da natureza e, de outro lado, conceber os europeus como tarados, carcomidos por uma tradição cultural e religiosa hipócrita, que vinham à América apenas para satisfazer suas paixões (sensualidade e cobiça) reprimidas pela civilização européia.

Diante das injustiças cometidas contra os índios levantou-se a voz dos missionários, teólogos, papas e reis católicos. Avultam, por exemplo, as figuras de frei Montesino, o filósofo dominicano espanhol Francisco de Vitória, professor da Universidade de Salamanca, um dos fundadores do Direito Internacional Público, e autor da célebre Relação De Indis, obra em que examina os títulos que legitimavam a entrada dos europeus na América (entre eles a natural sociabilidade dos homens) e afirmava os direitos naturais dos aborígines. A doutrina de Vitoria funda-se na noção de natureza humana comum a todos os homens. A edição de De Indis que possuo diz na apresentação: La corte de Fernando el católico movilizó juntas de teólogos y juristas en Burgos y Valladolid para encauzar aquel grito revolucionario. Se promulgó la primera legislacion de Indias, para el buen trato de los naturales y regulando sus trabajos en las encomiendas.

Por sua vez, o magistério da Igreja posicionou-se  contra qualquer tipo de escravidão. Em 1462,  Pio II censurou a redução a cativeiro de indivíduos da África. Em 1537, Paulo III, com a bula Sublimis Deus, e Urbano VIII, com a bula Comisssum nobis, de 1639, tomaram a defesa dos índios (cf. A Igreja e a escravidão, do cônego José Geraldo Vidigal de Carvalho, Rio de Janeiro, 1985). Igualmente, a monarquia bragantina, influenciada pelo grande padre Antonio Vieira, tomou a defesa da liberdade dos índios através da lei promulgada pelo príncipe Pedro II. A propósito, Maxime Haubert em sua memória apresentada na Real Academia de Bruxelas, L’Église et la defense des “sauvages”  (Bruxelas, 1964) diz: Les rois catholiques s’entouraient de toutes garanties morales et juridiques, et leurs décisions n’avaient rien d’arbritraire ou improvisé. Elles étaient longuement elaborées par le Conseil d’Outremer, Conselho Ultramarino, crée en 1642. Les rois prenaient l’avis des missionaires, des colons, des indiens.

Outro aspecto do problema em torno do qual há muita confusão e exagero é a questão da densidade demográfica índigina no Brasil. Fala-se de um “holocausto” como o da Segunda Guerra. Na verdade, no vastíssimo território do Brasil havia imensas regiões despovoadas ou pouco povoadas. Calcula-se que no Brasil a população indígina no ano de 1.500 era em torno de 1.100.oo0, tendo diminuído para 500.000 por volta de 1.940 (Cf.  a nota ao pé de página de Boehrer, in Apontamentos para a civilização dos índios bárbaros do Reino do Brasil, de José Bonifácio de Andrada e Silva) . Se considerarmos a enorme miscigenação que houve nos primeiros séculos, a redução da população indígina provocada por atos de violência ou por pestes disseminadas por europeus não foi tão drástica como se diz.

Ademais, é preciso afirmar que os povos nativos, antes da chegada dos europeus, estavam dominados por costumes mais que desumanos, monstruosos, que a reta razão não pode justificar. Esses costumes só se explicam como consequência da idolatria, do culto satânico oferecido pelas falsas religiões aos ídolos.  Só se explicam pelo obscurecimento da consciência moral em decorrência dos vícios arraigados em uma pseudo-cultura pagã. As várias nações indíginas viviam guerreando entre si, dominando as mais fortes brutalmente sobre as mais frágeis, oferecendo sacríficios humanos em uma verdadeira hecatombe. São inúmeros os documentos históricos que provam essa triste realidade, que foi sendo corrigida e abolida por obra dos generosos e heróicos missionários católicos. Aqui no Brasil as cartas do Beato José de Anchieta relatam esses fatos. Há uma carta em que ele conta como tentou salvar uma criancinha recem-nascida enterrada viva pelas índias que davam gargalhadas enquanto o santo missionário tentava salvá-la.

É fato incontestável que os europeus foram recebidos como libertadores pelas nações indíginas oprimidas. E recorde-se ainda a história de Montezuma, que acolheu bem os espanhóis no México porque guardava a antiga tradição de Kukulcan (que não é um mito), segundo a qual homens do Oriente viriam, submeteriam todos os povos e destruiriam sua religião.

José Huby, em Christus – Manual de historia de las religiones (Buenos Aires, 1952), descreve os rituais de uma barbárie inaudita da religião dos aztecas. O culto do deus Huitzilopochtli, diz Huby, inaugurou os sacrifícios humanos em tal número e de forma tão monstruosa, que o historiador se recusaria a admiti-los se não pudesse provar sua existência  com documentos seguros e irrefragáveis (o. c. p. 125).

E aqui entre nós, no Brasil, Paulo Prado em Retrato do Brasil – ensaio sobre a tristeza brasileira, não poupando críticas aos primeiros colonizadores portugueses por sua luxúria e cobiça (críticas, a meu ver exageradas) também se refere aos costumes desumanos dos silvícolas (reproduz um impressionante depoimento de Gabriel Soares sobre os tupinambás) e diz que os jesuitas, em um período em que havia tanta desordem e abuso, representaram o poder moderador, o elemento de cultura moral, de exaltado misticismo (…) pregavam pela palavra e pelo exemplo: a abnegação, o desprendimento de si foram entre eles qualidades nunca desmentidas.  E acrescenta que lutaram contra os interesses, as ambições, a cobiça dos colonos.

Leão XIII disse que a história tem sido uma conspiração contra a verdade. Aqui no Brasil mais que nunca essa conspiração é urdida pelo governo federal através da comissão da mentira e  da rede pública de ensino. Não podemos ficar apáticos e indiferentes se não quisermos perder nossa identidade, nossos valores, nossa fé.

Pe. João Batista de A. Prado Ferraz Costa

Anápolis, 31 de janeiro de 2013.

Festa de São João Bosco

 

 

Infalibilidade monolítica e divergências entre antimodernistas

Postado por Admin.Capela em 31/jan/2013 - Sem Comentários

Arnaldo Xavier da Silveira

1. O mundo católico deve muito ao povo simples que conserva a fé verdadeira, bem como aos escritores e homens de ação antimodernistas que nos últimos decênios têm desenvolvido amplamente as doutrinas e ações em defesa do depósito sagrado da Tradição. Em variados campos da teologia, especialmente na eclesiologia e na liturgia, o aprofundamento dos princípios tradicionais tem sido notável; e, no terreno prático da vida católica, igualmente, os antimodernistas têm batalhado com denodo heroico que no futuro a História da Igreja registrará com destaque.

 

Divergências nos meios antimodernistas

2. Não são poucos, entretanto, os desacordos que têm surgido, na teoria como na prática, entre os antimodernistas. Alguns aceitam incondicionalmente o Concílio Vaticano II, outros não. Alguns se denominam tradicionalistas, outros rejeitam essa qualificação [1]. Alguns dizem que o Papa Honório foi herege, outros o negam, e análogas divergências existem em relação a numerosos fatos da história da Igreja. Muitos adotam algumas teorias doutrinárias modernistas, a ponto de se afastarem da ortodoxia, embora continuem a dizer-se tradicionalistas. E por aí seguem as diferenças nos modos de ver, chegando com frequência a graves aversões pessoais.

3. No atual momento histórico, não parece possível conciliar posicionamentos tão diversos e mesmo opostos entre si. É de esperar que, com o tempo, com o amadurecimento das ideias, com o influxo da graça que não pode abandonar a Igreja, as orientações dos fiéis verdadeiros caminhem para convicções convergentes e sólidas, de modo que, submissos ao Magistério como manda a lei da Igreja, os antimodernistas acabem por harmonizar melhor suas posições, respeitado sempre o velho princípio: in necessariis unitas, in dubiis libertas, in omnibus caritas.

 

Uma infalibilidade monolítica?

4. Existe um ponto doutrinário fundamental ao qual não se vê que os doutrinadores mais eminentes do antimodernismo, bem como seus seguidores, deem a importância devida. Trata-se do princípio de que pode haver erros e heresias em documentos do Magistério pontifício e conciliar não garantidos pela infalibilidade [2].  Com efeito, esse princípio está em geral ausente dos arrazoados antimodernistas, que nos últimos decênios têm alimentado e sustentado o orbe católico com a boa doutrina.

5. Negar de modo absoluto a possibilidade de erro ou mesmo de heresia em documento pontifício ou conciliar não garantido pela infalibilidade, é atribuir a esta um caráter monolítico, que não corresponde ao que Nosso Senhor quis e fez ao instituí-la. As prefiguras neotestamentárias são claras: a barca de Pedro quase soçobrou, só sendo salva por um milagre; Pedro renegou a Jesus Cristo, e não esteve ao pé da Cruz. Para o episódio da resistência de São Paulo a São Pedro na questão dos ritos judaicos, busquem-se as explicações mais subtis que possam ser excogitadas, mas é incontroverso que São Pedro era “digno de repreensão” (“reprehensibilis erat”) [3].

 

Dos ensinamentos não infalíveis

6. Na história da infalibilidade pontifícia prevalece até nossos dias, infelizmente, mesmo em autores tradicionais dos mais consagrados, a divisão simplista e dicotômica, segundo a qual o Papa só pode falar, em matéria doutrinária: (1) como doutor privado, ou (2) numa definição infalível do Magistério extraordinário. Para tais autores, “non datur tertium”, isto é, não há outro modo pelo qual o Papa possa falar, não há como fugir a essas duas alternativas. Nessa linha, fica na sombra a terceira possibilidade, que é a de um pronunciamento magisterial público mas não infalível. Com efeito, foi apenas a partir do século XIX que se explicitou melhor e se cristalizou a noção do Magistério ordinário não infalível, e que os Papas e os grandes doutores aprofundaram a doutrina preciosa e riquíssima segundo a qual o Magistério Ordinário pode gozar da infalibilidade, quando universal no tempo e no espaço, preenchendo ainda as demais condições da infalibilidade.

7. Grandes autores da neoescolástica, preocupados em combater o liberalismo, o modernismo e heresias afins, ressaltaram sempre a autoridade doutrinária papal, parecendo insinuar às vezes uma infalibilidade monolítica, que subsistiria de modo absoluto em todas as circunstâncias, como se não dependesse de condições, nem mesmo das que foram expressamente declaradas no Concílio Vaticano I. Na neoescolástica encontra-se entretanto, com frequência, maior precisão nesses conceitos, tornando-se assim claro que, ocasionalmente, ou em períodos de crise, ou quiçá em outras circunstâncias extraordinárias, são possíveis pronunciamentos papais que não exprimam a verdade. E, nesta matéria, o que vale para o Papa vale também, mutatis mutandis, para o Concílio [4].

8. Há quem diga que, embora nem sempre garantido pela infalibilidade, um pronunciamento doutrinário papal ou conciliar não pode conter erro. Essa posição se enuncia melhor da seguinte forma: dizer que um ensinamento não é infalível, não significa que nele possa haver erro, significa apenas que tal ensinamento não está formalmente garantido pelo carisma da infalibilidade; para esse ensinamento, no entanto, mesmo não assegurado pela infalibilidade, permanece a assistência do Espírito Santo, e portanto vale o princípio de que não pode conter erro. ― A boa doutrina, contudo, é outra. Essa assistência prometida à Igreja pode ser absoluta, assegurando a verdade do ensinamento, e o é quando estão preenchidas as condições da infalibilidade. Quando, entretanto, não estão preenchidas tais condições, é possível a recusa da graça pelo homem. E aplica-se então a regra enunciada por Santo Tomás: “quod potest esse et non esse, quandoque non est (“o que pode ser e não ser, às vezes não é”). Em sã lógica, não se vê como acolher a noção inflacionada e monolítica da infalibilidade, que levaria ao absurdo de um “falível infalível[5].

 

Distinguindo o herético do  “heretizante”

9. Se pode haver erro ou mesmo heresia em documentos papais e conciliares, a fortiori pode haver neles proposições merecedoras de censuras menos graves. Aplicado esse princípio ao Concílio Vaticano II, vê-se que o problema  não é só saber se nele haveria heresias formais, mas é também verificar se, em confronto com a Tradição, há nos seus documentos finais proposições favorecedoras do erro ou da heresia, com sabor de erro ou de heresia, ofensivas aos ouvidos pios, escandalosas, ou merecedoras de outras censuras teológicas. Numa palavra, não se trata apenas de saber se no Concilio há erros ou heresias, mas também de verificar se nele há proposições heretizantes [6].

10. Manifestamente, uma proposição conciliar errônea, herética ou heretizante não se incorporaria ao patrimônio das verdades de fé, por não estarem aí preenchidas as condições da infalibilidade do Magistério ordinário. Tal proposição seria uma declaração falha do Concílio, o qual não goza de uma infalibilidade monolítica. Ademais, caso ocorram várias proposições heretizantes, articuladas entre si num mesmo sistema, este, igualmente, não se incorporaria à doutrina da Igreja.

 

Em conclusão

11. Entendo que são apodíticos os argumentos escriturísticos e da Tradição que fundamentam a doutrina da possibilidade de erro e heresia em documento papal e conciliar não infalível. Por outro lado, a noção da infalibilidade monolítica inspira a maior parte, tanto dos sedevacantistas, quanto dos neoconciliares que atribuem força dogmática ao Vaticano II; e está na raiz de dúvidas, perplexidades e angústias que atormentam numerosos espíritos fiéis. Um amplo esclarecimento dessa matéria seria um fator de convergência, apto a eliminar mal-entendidos e a reduzir diferenças de visão que há, na doutrina e na prática, entre pensadores e movimentos antimodernistas.

 

________________________

[1]  Para indicar o gênero daqueles que abraçam a fé verdadeira, seguindo a Tradição católica, emprego de preferência o termo “antimodernistas”, que parece mais abarcativo do que os demais que são correntes, como ”tradicionalistas” e “antiprogressistas”.

[2]  Ver “La Nouvelle Messe de Paul VI: Qu’en Penser?”, que publiquei em 1975, Diffusion de la Pensée Française, Chiré-en-Montreuil, parte II, caps. IX et X, e trabalhos ali citados.

[3]  Gal. 2, 11.

[4]   “(…) o problema do critério da infalibilidade não se põe de maneira essencialmente diferente no caso do papa e no do concílio ecumênico. Um e outro, com efeito, podem ter a intenção de envolver sua autoridade de maneira apenas parcial, ou de maneira irrevogável. Somente esta última vontade é critério certo de infalibilidade” (Charles Journet, “L’Eglise du Verbe Incarné”, Desclée de Brouwer, 3ª ed. aumentada, 1962, t. I, p. 578, nº 1)].

[5]  A expressão é de Jean Madiran, in Le faillible infaillible : l’analyse de Jean Madiran, La Riposte Catholique, 27.11.2012.

[6]  Pode-se perguntar se o que aqui escrevo não se chocaria com o apelo de Bento XVI, em discurso à Cúria Romana de 22-12-2005, para que o Concílio seja interpretado segundo uma “hermenêutica da reforma na continuidade”. ― Na mesma ocasião, o Papa declarou que a aceitação do Vaticano II, “em grande parte da Igreja”, isto é, entre os antimodernistas, depende de uma “justa chave de leitura e de aplicação”. Em espírito filial e de religiosa submissão ao Magistério vivo em toda a medida que a doutrina católica a impõe, digo que as dúvidas e polêmicas sobre o Vaticano II, que há décadas enchem de perplexidade os católicos fieis, certamente se reduzirão, ou talvez mesmo desaparecerão, se Sua Santidade declarar, de modo mais específico do que até agora o fez, e absolutamente preciso, qual é essa “chave” da interpretação do Concílio como “reforma na continuidade”. Por sua natureza, essa declaração não pode deixar de esclarecer se é teologicamente possível que haja proposições errôneas, heréticas ou heretizantes em ensinamentos conciliares de caráter doutrinário que não preencham os requisitos da infalibilidade.

A Capela Mór

Postado por Admin.Capela em 19/jan/2013 - Sem Comentários

Por Dom José Carlos de Aguirre

Dom José Carlos de AguirreNosso Senhor deu a Igreja uma organização hierárquica: Clero e laicato.

No templo, o lugar reservado ao clero é a «Capela Mór ».

Capela mór é a parte da igreja separada da nave central pelo arco-cruzeiro ou arco-triunfo.

Compõe-se de: abside atrás do Altar mor, presbitério, ou santuário, anterior ao Altar mor (elevado sobre o nível da nave central alguns degraus ímpares); coro da oficiatura divina, fechado por uma grade no arco-cruzeiro.

Antigamente, era em geral a seguinte disposição da capela mor:

Na abside, atrás do Altar mor, bem no fundo, ficava o trono episcopal, ladeado em semicírculo de assentos dos cônegos e clérigos cantores, formando o que se chama um coro. Depois, o Altar foi recuado mais para o fundo da abside, o trono episcopal passou para o presbitério, ao lado do Evangelho, e o coro ou assentos dos cônegos e clérigos cantores desceu para além do presbitério, ficando este só para os clérigos em função no Altar. O próprio Bispo, quando em simples vestes corais, tem seu assento no coro, entre os cônegos.

Esta é a disposição atual da capela mor.

O presbitério, plano anterior ao Altar mor, é destinado ao desenvolvimento das funções litúrgicas do Altar. Nele se instalam as credencias, os escanos ou bancos dos ministros sagrados em função, e, eventualmente, o trono episcopal. Para tanto, deve medir, pelo menos, quatro metros de fundo (do supedâneo do Altar á cancela, ou mesa de comunhão).

O presbitério, ou santuário deve ser vedado aos leigos: Laici arceantur, prescrevia o primeiro concílio de Milão. Nas igrejas onde não há coro (oficiatura de cônegos e clérigos), admitem-se leigos decentemente revestidos de opas, abaixo do presbitério.

As leis rituais da Igreja inspiram-se ainda hoje na antiga mentalidade clássica, que fazia da Mesa Eucarística penhor e símbolo de unidade, mesmo material e artística do templo de Deus.

Deus enche de sua majestade todo o templo, mas propriamente só habita e reside na parte mais íntima do edifício. Assim é, que, as outras partes, o transepto, a nave central, os pórticos laterais, o nartex, o pronao, o átrio, são como que outros tantos anexos da originária habitação da Divindade, uma extensão, uma amplitude de sua grandeza.

Por isso, enquanto o «presbitério ou santuário» é sempre reservado á Divindade e aos Sacerdotes que a representam, as outras partes são destinadas aos fiéis.

Para acentuar mais expressamente a distinção e a separação da Hierarquia e dos fiéis, uma divisória enclausurou sempre o recinto reservado a Hierarquia.

Nas igrejas cristãs, o lugar destinado ao Altar e ao exercício das funções hierárquicas foi sempre cercado de rigorosa inviolabilidade.

Diversos nomes designam uma santidade inacessível. Este recinto, que por sua elevação majestosa, seu místico isolamento e riqueza de sua decoração, exprimia a dignidade eminente do Sacerdote e de seus Ministros, era cercado duma clausura (sectum, cancellum, pluteum), através da qual era possível seguirem-se as circunvoluções dos Ministros no presbitério.

É conhecida a severíssima disciplina eucarística dos antigos, relativamente ao acesso ao presbitério. Era estritamente proibido aos leigos. O próprio Imperador Teodósio, quando foi a Milão, pensou gozar do privilégio de permanecer no presbitério após o Ofertório; mas o arcebispo Santo Ambrósio mandou-lhe recado, de que se lembrasse da diferença entre clérigos e leigos, diante do Altar do Senhor.

Os fiéis, para receberem a sagrada Comunhão, aguardavam junto às balaustras do presbitério, que assim se transformaram em Mesas de Comunhão.

Como se vê, a disciplina litúrgica era estrita nesse ponto. A Igreja ligava-lhe tal importância, que, para fazê-la respeitar, apelava para a autoridade dos Concílios. É que ela via nesta disciplina o símbolo expressivo da Hierarquia Sacerdotal, elemento necessário e essencial da sociedade de Jesus Cristo.

Através dos séculos, os cânones, os Concílios, os Decretos dos Bispos, as Decisões dos Sínodos têm-se sucedido ininterruptamente para subtrair o presbitério à invasão dos leigos. Os Decretos da Sagrada Congregação dos Ritos são neste sentido frequentes e rigorosos. Por seu lado, o Cerimonial dos Bispos, insiste também. Note-se, por exemplo, a seguinte passagem: «Os leigos nobres e ilustres, os magistrados e os Príncipes, ainda que sejam de primeira nobreza, devem ocupar cadeiras ornadas, segundo a dignidade e o grau de cada um, mas fora do coro e do presbitério» (Extra chorum et presbyterium).

Nota — Só o Chefe da Nação ou o Governador do Estado tem direito a ocupar um assento no presbitério (Cerimonial dos Bispos, III, IV).

Os leigos revestidos de batina e sobrepeliz são assimilados aos clérigos. Tais os coroinhas.

Oxalá tão veneráveis prescrições fossem fielmente observadas. O Altar erguer-se-ia em toda sua majestade, cercado do mais religioso respeito; os Ministros seriam mais reverenciados; as cerimônias desenvolver-se-iam com maior pompa e solenidade; os fiéis, mantidos a distância, em profundo acatamento, conceberiam uma ideia mais elevada do Sacerdócio, cujos ensinamentos ouviriam com mais docilidade.

Evacuem-se, portanto, os presbitérios, de leigos, mesmo dos revestidos de opa. Nada de cadeiras, poltronas, bancos, genuflexórios, além dos poucos assentos litúrgicos destinados aos Ministros Sagrados. O espaço vazio e amplo do presbitério dá uma impressão de mistério, de distinção respeitosa daquilo que é sagrado. Um número limitado de coroinhas ao serviço do altar, revestidos de batina e sobrepeliz, e nada mais. O próprio sacristão não deve aparecer no presbitério ou junto ao altar, em vestes seculares, durante as cerimônias.

Como é imponente presenciarmos, de baixo, do meio da assistência, as cerimônias desenvolvendo-se no presbitério! Por exemplo, esta parte da Missa cantada: Após o belíssimo canto do Prefácio e do «Sanctus», ao toque da campainha, eis sair da sacristia uma pequena procissão, majestosa, hierática, recolhida, deslizando pela nave em demanda do Presbitério. À frente, um acólito balançando em ritmo o turíbulo a despejar ondas de oloroso incenso, seguem-se dois a dois, seis acólitos em suas batinas pretas ou vermelhas, sobrepeliz amplas e alvíssimas, calçados lustrados, a empunharem tocheiros com velas acesas. À pequena distância do altar, distribuídos em linha, o turiferário no centro e três de cada lado, genuflectem a um tempo, sem rigidez marcial, e ali assistem de joelhos, recolhidos, ao soleníssimo ato da Consagração. Feita a elevação do cálice, levantam-se, genuflectem, e, formando nova procissão, recolhidos, regressam à sacristia.

O que custa a um Pároco zeloso preparar uns poucos meninos para esse ato e para o momento da benção do Santíssimo? Quanto não lucrariam em esplendor nossas festas litúrgicas, mais que com o Presbitério abarrotado de virgens e anjos irrequietos, opas por sobre vestes das mais variadas e pintalgas cores, numa promiscuidade de feita, a desviar a atenção dos fiéis do santo Altar.

Também a falta de coroinhas põe o Sacerdote em apuros no Altar, tirando-lhe a compostura pelo forçar a contínuos deslocamentos à procura deste ou daquele objeto. A intervenção dum leigo, nos ritos, ainda que revestido de opa, é incidente, diminui a gravidade do culto. De mais, a falta de coroinhas dá como consequência a falta de vocações sacerdotais numa paróquia.

É preferível, que o pároco ature as desenvolturas dos coroinhas, que dispensá-los de todo. Escolham-se os coroinhas entre os meninos dóceis, bem educados, de famílias piedosas e distintas. Havendo esta criteriosa escolha, as famílias de certa distinção não farão dificuldade, ante, se empenharão em ceder seus filhos para tão nobres funções, e até mesmo, zelarão de seu enxoval litúrgico. Estes enxovais não devem ficar ao capricho e fantasia do pároco ou dos fornecedores, mas devem ser uniformes, em rigoroso acordo com as normas litúrgicas. Estes enxovais devem conservar-se bem dobrados e guardados em gavetas apropriadas; não pendurados em cabides, onde sujam depressa.

Seria bom, que se guardassem na sacristia os sapatinhos, só para o serviço do Altar, bem escovados e lustrados.

Já que tocamos em coroinhas, bem é lembrar, que para a Missa rezada só se pode empregar um coroinha, a não ser nas Missas dominicais ou de alguma solenidade (neste caso se empregariam somente dois).

FONTE: http://ecclesiam.wordpress.com/2012/10/05/capela-mor/

A lei mosaica, o talmud, a cabala, a sinagoga e a Igreja

Postado por Admin.Capela em 12/jan/2013 - Sem Comentários

Si Si No No, na edição de 30 de novembro de 2012, publicou um excelente artigo sobre a relação entre a Igreja e o judaísmo, refutando a calúnia de fomentar o ódio racial e religioso que lhe foi assacada.

Traduzimos a seguir os parágrafos mais esclarecedores sobre o assunto. O artigo baseia-se principalmente sobre dois trabalhos científicos sobre a questão judaica: L’Antisemitisme, do jornalista israelita Bernard Lazare, e um estudo da Civiltà Cattolica.

O artigo de Si Si No No recorda a fundamental distinção entre o judaísmo do Antigo Testamento e o judaísmo talmúdico depois de Cristo. O esquecimento dessa distinção é causa de muita confusão sobre o problema. Diz o artigo assinado por Crispinus:

 

Sobre o assunto é preciso recordar a distinção importantíssima entre a lei mosaica e a talmúdica, entre o judaísmo antes e depois de Cristo. A lei mosaica, totalmente relativa ao Cristo futuro, foi retomada e aperfeiçoada pelo cristianismo; a lei talmúdica, ao contrário, é a antítese e a corrupção da lei mosaica e cristã. O talmud e a cabala espúria impediram a conversão do povo eleito ao Messias; o predomínio dos fariseus impediu que Israel entrasse na Nova e Eterna Aliança porque o talmudismo é uma degeneração carnal da religião mosaica. Com efeito, enquanto o mosaísmo ensinava que Israel tinha sido eleito para acolher o Cristo e fazê-lo conhecido a todas as nações e povos, os fariseus e cabalistas talmudistas sustentavam que o mudo foi criado “para ser submetido ao império universal…dos hebreus (Bernard Lazare, o. c. p. 14). Eis aí a nova religião judaica que não tem nada que ver com a Bíblia e com Moisés: o domínio do hebraísmo sobre o mudo todo!

Segundo esta concepção, de uma parte estão os hebreus, os verdadeiros homens, e de outra parte, os não hebreus, os “goins”, que são como bestas falantes e devem ser escravos dos hebreus. Quando vem o Messias pregando o Evangelho do Reino dos Céus, aperfeiçoamento e cumprimento do Antigo Testamento. os fariseus e talmudistas, embora soubessem que Ele era o Messias e o próprio Deus. odiaram-no profundamente até condená-lo à morte, porque lhes contradizia o sonho imperialista de domínio material sobre o mundo inteiro.”

É com a corrupção do mosaismo em talmudismo que teve início uma perseguição sistemática contra os hebreus, também no mundo pré-cristão (cf. B. Lazare, o. c. p. 17). Esse fenômeno explica-se facilmente: ao nascer o ódio e o desprezo a todos os povos não judeus, nasce também a inevitável reação destes últimos.

O artigo explana também com argumentos lúcidos a relação entre o judaísmo e o protestantismo, bem como explica o papel da Inquisição em relação aos judeus:

“Contrariamente a quanto se crê em geral, a Inquisição não perseguia os hebreus por causa da raça ou da religião deles, mas somente na medida em que eles incitavam à judaização ou, então, após uma eventual conversão ao cristianismo, voltavam a judaizar.

A Igreja não queria a eliminação dos hebreus (postos em um estado de inferioridade legal) considerando-os um testemunho vivo do triunfo de Cristo. “Asssim, o único apoio – admite B. Lazare – que o hebreu encontrou foi o Papado e a Igreja. Se a Igreja conservou os hebreus não foi tadavia sem replicar-lhes e puni-los (,,,). Mas o papel principal da Igreja foi o de combater dogmaticamente a religião hebraica (o. c. p. 70).”

Quanto à falsa reforma protestante, diz o artigo que já antes da revolução religiosa, no período do Humanismo e da Renascença, os cristãos se tornaram menos fervorosos, enquanto os judeus não mudavam em nada seu modo de ser. Os judeus passaram a ser admitidos pelos humanistas como mestres do hebraico e iniciaram a muitos nos mistérios da Cabala. (De fato, a história da filosofia registra no período um surto de esoterismo, ocultimo e hermetismo). Com isso, o hebraismo contribuiu muito para uma nova exegese da Sagrada Escritura que o protestantismo empregou contra a Igreja, esclarece o artigo: “Quando Lutero publicou suas teses (…) por um instante os teólogos esqueceram os hebreus e o movimento que se estava propagando, movimento que lançava suas raízes nas fontes hebraicas. É o espírito hebraico que triunfa com o protestantismo (….). É singular a analogia entre Lutero e Maomé. Ambos fundamentam suas doutrinas nas fontes hebraicas (Bernard Lazare, o. c. p. 73-84).

Cumpre acrescentar, no que se refere à relação entre judaísmo e protestantismo, que no protestantismo popular dos nossos dias, nas seitas mais vulgares, a influência do judaísmo é muito mais notável, sobretudo pelas interpretações mais esdrúxulas do Antigo Testamento e da teologia da prosperidade.

Como dito acima, o artigo de Si Si No No reporta-se a um estudo da outrora respeitadíssima publicação dos jesuitas La Civiltà Cattolica. Em um artigo publicado em 1884, diz assim La Civiltà Cattolica: ” A antiga e a moderna  Sinagoga (…) são entre si  não só divergentes mas apostas (…). Se os hebreus de hoje seguem a lei mosaica, não se pode achar razão suficiente desta sempre mais profunda antipatia entre o judeu e o não judeu, especialmente se cristão (…). Ora, essa razão encontra-se naquela contradição que há entre a antiga, santa e assistida Sinagoga mosaica e a moderna, ímpia e inspirada sinagoga rabínica. Essa contradição versa sobre os pontos não apenas de fé mas de moral e não só da moral cristã mas também da moral natural (…) O judaísmo de hoje é contrário à lei de Mosés e dos Profetas.”

O artigo conclui-se com a afirmação bem clara de que não se trata de antissemitismo (vocábulo equívoco porque nem todos semitas são judeus), dizendo:

“O católico deve desejar de coração que os judeus se convertam e vivam; portanto querer liquidar o problema hebraico mediante o ódio gratuito é um desígnio criminoso e louco. O católico, além do mais, não pode ficar indiferente ou ignorar que o judaísmo atual se acha em um estado de reprovação da parte de Deus e por isso deve esforçar-se, com caridade unida à prudência (“simples como as pombas, prudente  como as serpentes), por ajudar os judeus a sair do seu estado de orgulhosa cegueira, que os impede de reconhecer o Messias já vindo e os leva a sonhar com outro messias que lhes dará o domínio sobre o mundo todo.

Tudo isto não é antissemitismo mas o coração do verdadeiro cristianismo: “A vossa fala seja sim sim não não, o mais vem do maligno.”

O excelente artigo de Si Si No No representa uma grande contribuição para esclarecer um dos pontos nevrálgicos da crise da Igreja que explodiu por ocasião do Vaticano II, com o falso ecumenismo e o diálogo interreligioso (Nostra Aetate e Dignitatis Humanae) que contradizem o magistério tradicional ( cf. Mortalium animos de Pio XI). Com efeito, é absolutamente falso dizer que os judeus de hoje são nossos irmãos mais velhos na fé ou nossos pais na fé. Ou pior ainda dizer que a sinagoga de hoje é irmã mais velha da Igreja Católica ou sua mãe na fé!  Abraão, sim, é nosso pai na fé, é pai dos crentes.  Nosso Senhor,  no Evangelho, diz que Abraão viu o seu dia e alegrou-se (Jo. 8, 56). Abrãao, Moisés e os profetas são nossos pais na fé. O Talmud, a falsa Cabala, não. (Para maiores esclarecimentos sobre o assunto leia-se Él judio en el misterio de la historia, do Pe. Julio Meinvielle, Cuz y Fierro, Buenos Aires, 1988; El talmud desenmascarado!, Editorial La Verdad, Lima, 1981; Il mistero della sinagoga bendata, de Enrico Maria Radaelli, Effedieffe, Milano, 2002)

Ao concluir esta resenha muito resumida do artigo de Si Si No No, desejaria dizer que nesses tempos de apostasia pós-conciliar uma das pessoas que mais me ajudou a preservar a fé foi um ilustre leigo católico convertido do judaísmo, o qual foi foi também um colaborador de Gustavo Corção.

Tradução e comentários do Pe. João Batista de Almeida Prado Ferraz Costa

Anápolis, 12 de janeiro de 2013

A agonia do Ocidente na visão de pigmeus e gigantes

Postado por Admin.Capela em 08/jan/2013 - Sem Comentários

Tornou-se hoje lugar comum  falar em decadência do Ocidente e ascensão da Ásia. Principalmente nesta temporada do ano, após tantas dificuldades em 2o12, as análises e comparações entre as duas partes da Terra se multiplicam com os mais variados prognósticos.

Gilles Lapouge, há poucos dias, publicou uma matéria com informações e números chocantes sobre a crise dos países da zona do euro. Ele referiu-se a um processo de desindustrialização da Europa em geral, com exceções (temporárias?) da Alemanha e da Inglaterra, por ser esta, ainda, importante centro financeiro. Elogiou a Islândia que preferiu enfrentar com altivez os seus próprios problemas a submeter-se às rédeas da pastora alemã e dos tecnocratas de Bruxelas. Diz Lapouge que a Europa, que nos últimos anos, em parceria com os EUA, era o centro do mundo, cede o lugar para Ásia e para o Oriente se voltam todos os olhares. E conclui sua análise manifestando sua esperança de que a Europa, retomando suas energias, vença esse desafio e reverta o quadro.

Por sua vez, Marc Hujer (de Der Spiegel) traça um quadro tenebroso da situação financeira dos EUA, falando da falência de um país que não aproveitou os anos de prosperidade para manter sua infraestrutura. Diz que as cidades dos EUA afundam em dívidas, mencionando especialmente o município de San Bernardino, onde faltam recursos até para pagar as pensões dos funcionários.

Não se nega a importância do fator econômico para a análise da realidade do mundo em que vivemos. Mas o que me parece inaceitável e cientificamente contestável é ater-se ao aspecto econômico e ignorar a dimensão moral do problema. Lendo todas essas matérias citadas, não se encontra uma palavra sequer sobre a crise da família, o baixo índice de natalidade, o envelhecimento da população, a desorientação da juventude, a invasão islâmica etc. Ora, todas essas coisas têm grande incidência sobre a crise financeira. Sabe-se, por exemplo, que um dos nossos grandes problemas, a baixa qualidade da mão de obra, não resulta tanto da falta de qualificação técnica quanto da falta de educação e má formação moral. E isto não ocorre só no Brasil. Enfim, vivemos o mal do economicismo. Nenhuma preocupação com os valores espirituais. Nenhum sinal de apreço pelas nossas raízes culturais. Tudo não passa de produto que deve circular pelo mercado global.

Tudo isso me fez lembrar as palavras de dois grandes pensadores católicos do século XIX, o Pe. Emmanuel André, autor de um precioso opúsculo La Sainte Eglise, entre outras obras de grande valor, e o visconde de Bonald, autor da célebre Théorie du pouvoir  politique et religieux. No citado opúsculo, o padre Emmanuel André faz uma penetrante reflexão sobre a história da Igreja e o drama do fim dos tempos e diz que, por um castigo infligido pela Providência Divina à apostasia das antigas nações da Cristandade, o Ocidente entraria em declínio e a Ásia teria uma ascenção. Diz o Pe. Emmanuel:

Les races latines sont vouées á execer dans le monde une influence catholique, ou bien à abdiquer. Leur mission est de servir à diffusion de l’Evangile; et leur existence politique est liée à cette mission. Du jour où elles y renonceraient par l’apostasie complète, elles seraient annihilées; et l”Antéchrist, surgissant probablement en Orient, les foulerait facilmentent aux pieds. E, em nota ao pé de página, acrescenta o padre André: C’est la tradition des premiers âges de l’Eglise, consignée dans Lactance, qu’ un jour l’empire du monde retournera en Asie: Imperium in Asiam revertetur (Clovis, 1997).

Em conclusão de suas reflexões sobre esse drama da história da Igreja, diz o padre André que incumbe aos cristãos agir no campo político para levar os governos a restabelecer as tradições cristãs, fora das quais não há se não decadência para as nações européias e, especialmente, para a pobre França.

Já o visconde de Bonald, em obra publicada em 1843, diz  que “A juger de l’avenir par le passé, les dechiremens effroyables qu’eprouva l’empire Romain par les inondations successives des Barbares, et sa dépopulation presque universelle, se répéteraient sur la malheureuse Europe: les mêmes peuples qui se faisaient appeler les fleaux de Dieu, viendraient la punir d’avoir oublié la Divinité, comme ils la punirent alors d’en avoir défiguré l’idée.” (Librairie D’Adrien le Clere, 1843).  E para corroborar sua tese Bonald cita o insuspeito Rousseau que diz algo no mesmo sentido.

Hoje, se temos de ler jornais da grande imprensa liberal para  manter-nos  informados, não podemos contentar-nos com essas leituras. É lamentável ver católicos assimilando o conteúdo de jornais e semanários órgãos da judeu-maçonaria, como se fossem oráculos sagrados. Infelizmente, temos de ler os jornais, repito, mas é absolutamente necessário julgar as informações veículadas à luz dos princípios eternos, dos ensinamentos dos grandes mestres da filosofia perene. Do contrário, seremos arrastados pela correnteza desse rio poluído  e pestífero da modernidade.

Pe. João Batista de Almeida Prado Ferraz Costa

Anápolis, 8 de janeiro de 2013