Alter Christus

Postado em 15-07-2016

Não sou sacerdote, sou apenas christifidelis laicus, um cristão católico, batizado, crismado, que se confessa e comunga. Não sou tampouco um leigo “engajado” como se costuma dizer hoje. Tenho, porém, uma ideia alta, sublime, do sacerdote, a mesma que tem Jesus, como se revela no Evangelho e nas epístolas de São Paulo, particularmente na Epístola aos Hebreus. Esta ideia é contradita por certos padres de hoje que não pregam mais Jesus nem sequer aos pequenos e aos doentes, que consideram a missa uma coisa aborrecida a ser evitada o máximo possível, que, pelo seu modo de viver e falar, dão a fundada impressão de não crer em mais nada.

Esses padres já perderam a sua identidade sacerdotal mais autêntica e, como disse um jovem amigo meu muito lúcido, não sendo mais leigos e tampouco vivendo como sacerdotes, são personagens a estudar.

Conheço um ex-padre que a cada chegada de um novo bispo à sua diocese, vai perguntar-lhe: “Mas quem sou eu? Um padre ou um leigo?”, até um dia em que um bom cônego, que se manteve firme na fé de sempre, lhe disse: “Você é um cretino!”

Diante da pergunta: “Que é o sacerdote?”, sou inclinado a citar os sacerdotes santos, tais como o Cura d’Ars (São João Maria Vianney), São João Bosco ou o bem-aventurado Edward Poppe ou o venerável Pio XII, ao lado de tantos outros.

Lendo-lhes as biografias, aparece claramente quem é o sacerdote, assim como o quis Jesus Cristo, Sumo e Eterno Sacerdote.

Tudo parte de Jesus, o qual, sendo Sacerdote, ofereceu-se a si mesmo como hóstia (= vítima). “Ofereceu-se porque o quis” (Is. 53, 7); Eu dou a vida….ninguém ma toma…tenho o poder de dá-la e retomá-la de novo” (Jo. 10. 18).

Ele ofereceu-se sobre a cruz em adoração ao Padre, em expiação do pecado de cada homem – do pecado original até o fim do mundo – para libertar-nos do inferno e da morte eterna, para merecer-nos a vida divina da graça, isto é, a nossa elevação à ordem sobrenatural e abrir-nos o paraíso.

Só Jesus é Sacerdote, como só Ele é vítima; quis, entretanto, ter necessidade de ministros, de continuadores do seu Sacrifício até o fim dos séculos. Antes da sua paixão e morte, na última ceia com os seus apóstolos, instituindo a Eucaristia, sua Presença real no meio de nós, deixou à Igreja o seu Sacrifício e ordenou aos seus mesmos apóstolos e aos seus sucessores que o perpetuassem (Lc. 22, 19-20; I Cor. 11, 23-29).

E é por isso que todos os sacerdotes sobre a Terra, ordenados antes de tudo para tornar presente na Eucaristia Jesus vivo e verdadeiro (sacerdos propter Eucaristiam), são e devem ser em primeiro lugar totalmente cristo-teocentricos, quer dizer, concentrados e enraizados em Jesus Sumo e Eterno Sacerdote, fonte, arquétipo, modelo e paradigma de todo sacerdócio, para o culto e glória de Deus.

O sacramento da ordem sagrada imprime no ser de quem o recebe um novo ser, uma nova realidade ontológica: o caráter sacerdotal, como profunda configuração e assimilação com Cristo, Sacerdote e Vítima. Não é só uma configuração metafórica, mas real, na qual a forma de Cristo se imprime na alma e a “cristifica” até as suas mais íntimas fibras.

O próprio Jesus, por conseguinte, obra realmente no seu ministro: é Jesus que batiza, que absolve, prega e conduz as almas e o mundo à comunhão de vida com Deus na graça santificante até ao paraíso.

Jesus e o seu sacerdote são uma unidade inseparável no púlpito, na cátedra, no batistério, no confessionário e, de um modo ainda mais extraordinário, no altar.

Eis, o sacerdote verdadeiro é um “alter Christus”. Esta é a grandeza e o fascínio sublime de todo sacerdote que vive o seu sacerdócio. Todavia, infelizmente, hoje a “fumaça de Satanás entrou na Igreja de Deus, como reconhece o mesmo Paulo VI, e cumpriu-se a triste “profecia” feita em 1938 pelo cardeal Eugênio Pacelli, o futuro Pio XII:

“Há de vir o dia em que o mundo civilizado renegará o seu Deus, em que os homens da Igreja duvidarão, como Pedro duvidou à noite da prisão de Jesus. Serão tentados a crer que o homem se tornou deus, que Seu Filho é apenas um símbolo, uma filosofia como tantas outras, nas igrejas os cristãos buscarão em vão a lâmpada vermelha onde Jesus os espera e hão de perguntar-se como a Madalena que gritou diante da tumba vazia: “onde o puseram?”

Eis, Homens da Igreja, nós, pobres leigos, sempre mais estarrecidos ante o que fazeis, interrogamo-vos, como profetizou o cardeal Pacelli-Pio XII: “Jesus, o único Salvador, Aquele que deve ser a única razão da vossa vida, do vosso Sacerdócio, Jesus, onde o pusestes?”

Hoje, estamos diante de um tremendo esfacelamento, porque no lugar de Deus e de Seu Filho Jesus Cristo, único Salvador se pôs o homem: os seus problemas econômicos e sociais, o seu bem-estar, os seus valores verdadeiros ou pretensos, o homem – não mais Jesus Cristo – como medida de todas as coisas.

Com efeito, hoje, da parte daqueles que percebem que Jesus tem algo de decisivo a dizer à humanidade contemporânea para o presente e para o futuro, e de todos aqueles que, havendo-o já descoberto, não podem mais viver sem Ele, levanta-se a pergunta sempre mais incisiva: “Jesus, onde o pusestes?

Conhecemos em outros tempos (e ainda hoje) sacerdotes exemplares, completamente crisocêntricos: vivem de Jesus e dão Jesus às almas; ainda que com seus limites humanos, são “outros Jesus”.

“Não há no mundo – dizia o Santo Cura d’Ars – ninguém maior que o sacerdote. Se encontrasse um anjo e um sacerdote, primeiro saudaria  o sacerdote e depois o anjo. Porque só o sacerdote pode dar Jesus às almas e conduzir-nos ao paraíso.”

Esta, portanto, é a missão mais alta – a mais sublime – que exista sobre a Terra: tornar-se, ser “alter Christus”.

Pelo vosso Sacrifício, ó Jesus, sobre o Calvário e sobre o altar, por intercessão de Maria Santíssima, Mãe e Rainha dos vossos  sacerdotes, pelo exemplo e oração dos sacerdotes exemplares e santos, dai-nos ainda hoje, chamando-os entre os rapazes e jovens, sacerdotes deste jaez, desta estirpe. E, por meio deles, dai-vos a vós mesmo a nós. Nada mais.

Candidus

(Traduzido de Sì Sì no no 31 Marzo 2016)