Aonde se quer chegar? (Variações sobre história, política e religião)

Postado em 18-03-2014

Pe. João Batista de A. Prado Ferraz Costa

No mundo caótico de hoje nota-se uma coisa boa: cresce o interesse pela história, revigora-se o amor ao passado e à tradição. Na sociedade materialista em que vivemos, dominada pelo espírito utilitarista e pragmático, o interesse pela história é mais que nunca um sentimento nobre e generoso. Ninguém fica rico estudando história, ocupando-se de coisas de outros tempos.

Entretanto, a história tem grande utilidade, na medida em que lança luzes sobre o presente e descortina, de alguma forma, o futuro. O historiador não é profeta, mas pelas suas investigações dos documentos e das diversas fontes é capaz de ver o fogo que arde debaixo da brasa e, assim, compreender melhor a realidade presente e os rumos da humanidade.

Lendo algumas páginas da monumental História de Portugal de Alexandre Herculano encontrei ali uma confirmação de algo que já tinha ouvido: os judeus ajudaram os muçulmanos, sarracenos, berberes e mouros, a conquistar a Península Ibérica. Sobre os séculos de desolação e o declínio do império islâmico na Espanha, Alexandre Herculano diz que uma das causas da sua queda e consequente reconquista dos reinos cristãos foi o fato de o islamismo ser incapaz de fundar instituições políticas sólidas e estáveis, a despeito de o islamismo proceder de uma civilização mais avançada no Oriente.

Explana assim  Alexandre Herculano os acontecimentos do período que precedeu a Reconquista, fazendo uma notável apologia do Cristianismo:

“A fraqueza e falta de harmonia nas instituições políticas, estribadas apenas nas doutrinas falsas ou incompletas do Corão, a diversidade de raças unidas só pelo vínculo moral de uma crença comum e o despotismo ilimitado do supremo poder eram as causas principais dessa febre violenta que trazia o corpo social numa agitação perpétua, a qual, se a observamos atentamente, chega a produzir no espírito uma vertigem. (…)O quadro que nos oferece a Espanha repete-se em África, na Ásia, onde quer que os sectários do profeta levaram a fé muçulmana e a organização que em tal crença se fundava. Era ela, pois, a causa do mal. Ao passo que no Ocidente o cristianismo ia lançando as bases da paz e da ordem entre os povos semibárbaros e ferozes que adoravam o Deus do Calvário, as gentes maometanas do Oriente, incomparavelmente mais civilizadas, caminhavam para a dissolução e para a barbaria, à sombra do estandarte ensanguentado do islamismo. Contraste singular na verdade; prova sublime, posto que dolorosa, da origem pura e divina da crença cristã e da vaidade e mentira desta outra, que pelo fanatismo soubera fazer conquistadores, mas que se mostrou sempre inábil para constituir sociedades regulares e duradouras.” (História de Portugal, Lisboa, 1863, 3ª edição)

As reflexões do historiador Alexandre Herculano  (romântico e liberal à moda portuguesa) acima reproduzidas são muito oportunas e atuais. Servem como uma advertência para os homens prudentes de hoje verem o que ocorrerá no Ocidente dentro de poucas décadas. A elas deve acrescentar-se o fato de que a heresia ariana favoreceu grandemente a penetração do Islão na Península, como ocorre hoje com o modernismo que é a cloaca de todas heresias e se distingue por empalidecer o dogma da divindade de Cristo e da Santíssima Trindade.

O maometanismo, instalado na “civilizada” União Européia e com tentáculos pelos diversos países do Ocidente, causará a confusão final, desenganando os homens de Bruxelas e Washington. E aqueles que tiverem perseverado na fé vão desincumbir-se da missão histórica e providencial de reconquistar o mundo para Cristo.

O problema do avanço do islamismo por todo Ocidente, de tão comentado nos ambientes conservadores, tradicionalistas e direitistas, corre o risco de ser tratado superficialmente, sobretudo por aqueles que adulam e justificam os EUA sob qualquer pretexto e não vêem o grande perigo do que ocorre na Síria hoje. Com efeito, sabe-se que, com a ajuda ou à vista grossa dos EUA, há o plano de entregar Damasco aos muçulmanos radicais para ali restabelecerem o célebre califado, centro de irradiação do islamismo por todo globo terrestre. Sabe-se, ademais, que a guerra na Síria se internacionaliza, à maneira do ocorrido na Guerra Civil Espanhola, levando jovens muçulmanos europeus a tornar-se “jihadistas”, a comprar armas e sair ilegalmente de seus países para ir lutar na Síria.

À desordem política, à inevitável decadência econômica e cultural produzidas pela conquista do Islão, acrescerá uma medonha degradação moral e uma corrupção doutrinária que tornará a Igreja de Cristo irreconhecível. No último domingo, O Estado de S. Paulo publicou uma matéria que traz informações interessantes misturadas com muita tolice. Diz que um eminente teólogo luterano, George Lindbeck, observador  protestante oficial no Vaticano II, descreveu o dilema criado pelas ambiguidades fundamentais e extremas nas mais abalizadas declarações do Concílio. O referido teólogo faz uma reflexão muito importante que deveria ser seguida pelas autoridades eclesiásticas, ainda mais quando feitas em clima de ecumenismo por um protestante e não por um tradicionalista: “Quando a lei suprema da terra autoriza diretamente posições rivais, talvez contraditórias, e não oferece nenhuma maneira de solucionar disputas, o conflito é inevitável, e insolúvel se mudanças não forem realizadas na lei suprema.”

Eis um exemplo de quando um protestante, “um irmão separado”, dá uma boa lição aos modernistas que semearam a discórdia e confusão dentro da Igreja!

O referido artigo, escrito por um jornalista católico liberal americano, comentando a revolução desencadeada pelo bispo de Roma Francisco, augura que como fruto da pastoral de acolhida e do apostolado nas periferias existenciais, dentro de poucos anos, haja nas paróquias, sentados nos bancos das igrejas durante a santa missa, ao lado das famílias tradicionais, casais de gays e lésbicas, perfeitamente à vontade, sem nenhuma discriminação, dando um testemunho cristão de amor, de tolerância, de fraternidade.

Houve um filósofo que disse que a ideologia da Revolução Francesa, com o seu lema “liberdade, igualdade, fraternidade”, nada mais era que uma desnaturação do Evangelho reduzido a humanismo. De fato, a ideologia do bom selvagem propagada por Rousseau é uma secularização, ou aplicação política, da heresia pelagiana. Hoje Francisco I acusa os tradicionalistas de ser pelagianos. Na verdade, é o erro pelagiano que está por detrás de todas as reformas conciliares e pós-conciliares, porquanto é a confiança nas forças do homem moderno, nas capacidades do mundo e da ciência moderna de resolver todos os problemas, de salvar a humanidade, é tal confiança que levou a Igreja a abrir-se com toda simpatia e sem nenhuma prevenção ao mundo inimigo de Deus.

Procuremos, pois, na história e na tradição, alimento para nossa alma a fim de melhor entender os problemas atuais. Procuremos também na oração e nos sacramentos a força para lutar contra todos os inimigos da Santa Igreja.

Anápolis, 18 de março de 2014

Festa de São Cirilo de Jerusalém, bispo e doutor