Art. 1 — Se foi conveniente Cristo ser sepultado.

O primeiro discute-se assim. — Parece que não foi conveniente Cristo ser sepultado.

1. — Pois, de Cristo diz a Escritura: Chegou a ser homem como sem socorro, livre entre os mortos. Ora, nos sepulcros são encerrados os corpos dos mortos, o que, parece, é o contrário da liberdade. Logo, parece que não foi conveniente fosse o corpo de Cristo sepultado.

2. Demais. – Nada, devia ser feito, em relação a Cristo, que não fosse salutífero. Ora, parece que em nada contribuía para a salvação dos homens o ter sido Cristo sepultado. Logo, não foi conveniente que fosse sepultado.

3. Demais. — Parece inconveniente que Deus, o excelso sobre os céus, fosse sepultado na terra. Ora, o que convém a Cristo morto é atribuído a Deus, em virtude da união. Logo, parece inconveniente que Cristo fosse remunerado.

Mas, em contrário, diz o Senhor, da mulher que o tenha ungido: No que fezme fezuma boa obra. E depois acrescenta: Porquanto derramar ela este balsamo sobre o meu corpo foi ungir-me para ser enterrado.

SOLUÇÃO. — Era conveniente que Cristo fosse sepultado. — Primeiro, para comprovar a verdade da sua morte; pois, ninguém é posto num sepulcro senão quando consta que está verdadeiramente morto. Por isso no Evangelho se lê que Pilatos, antes de permitir que Cristo fosse sepultado, procurou saber por uma inquisição diligente, se estava morto. – Segundo, porque tendo ressurgido do sepulcro, deu a esperança de ressurgir, por meio dele, aos que estão sepultas segundo aquilo do Evangelho: Todos os que se acham nos sepulcros ouvirão a voz do Filho de Deus. – Terceiro, para exemplo dos que, pela morte de Cristo, morreram espiritualmente aos pecados, conforme àquilo da Escritura: Estão escondidos contra a turbação dos homens. Por isso diz o Apóstolo: Já estais mortos e a vossa vida está escondida com Cristo em Deus. E assim também os batizados, que pela morte de Cristo morreram aos pecados, são como consepultos com Cristo, pela imersão, segundo o Apóstolo: Nós fomos sepultados com Cristo para morrer pelo batismo.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – Cristo, mesmo sepulto, mostrou que entre os mortos era livre, pelo fato da inclusão no sepulcro não ter podido impedi-Ia sair dele pela ressurreição.

RESPOSTA À SEGUNDA. — Assim como a morte de Cristo obrou eficientemente a nossa salvação, assim também a sua sepultura. Por isso diz Jerônimo: Ressurgimos pela sepultura de Cristo. E àquilo da Escritura: E dará os ímpios pela sepultura, diz a Glosa: isto é, as gentes, que não tinham a piedade, da-tos-á a Deus Padre, porque os ganhou pela sua morte e sepultura.

RESPOSTA À TERCEIRA. — Como se diz num Sermão do concílio Efesino, nenhuma das coisas que servem a salvação dos homens fazem injúria a Deus; pois, mostram que ele não é passível, mas clemente. E noutro sermão do mesmo Concílio lemos: Deus não considera como injurioso nada do que pode ser para o homem ocasião de salvar-se. Pois, não irias ter por vil a natureza de Deus, admitido que ela possa jamais considerar-se sujeita a injúrias.