Art. 11 — Se a graça de Cristo era infinita.

O undécimo discute-se assim. — Parece que a graça de Cristo é infinita.

1. — Pois, todo o imenso é infinito. Ora, a graça de Cristo é imensa, como o diz o Evangelho: Não lhe dá Deus o Espírito por medida. Logo, a graça de Cristo é infinita.

2. Demais. — Um efeito infinito demonstra uma virtude infinita, que só pode fundar-se numa essência infinita. Ora, o efeito da graça de Cristo é infinito, pois, abrange a salvação de todo o gênero humano; pois, é a propiciação pelos pecados de todo o mundo como diz o Evangelho. Logo, a graça de Cristo é infinita.

3. Demais. — Todo finito pode, por adição, atingir a quantidade de qualquer coisa finita. Se, pois, a graça de Cristo fosse finita, a graça de um outro homem poderia crescer a ponto de igualar a graça de Cristo. Contra o que vai a Escritura: Não se lhe igualará o ouro nem o cristal, segundo a exposição de Gregório. Logo, a graça de Cristo é infinita.

Mas, em contrário, a graça é algo de criado na alma. Ora, todo criado é finito, segundo a Escritura: Todas as causas dispuseste com medida e conta e peso. Logo, a graça de Cristo não é infinita.

SOLUÇÃO. — Como do sobredito se colhe, podemos considerar em Cristo uma dupla graça. — Uma, a de união, consistente, como dissemos, no fato mesmo de estar unido pessoalmente ao Filho de Deus; e isso foi gratuitamente concedido à natureza humana. E essa graça é infinita, por ser infinita a Pessoa mesma do Verbo.

Outra, porém, é a graça habitual que também é suceptível de dupla consideração. — Primeiro, como um determinado ser. E então há de necessariamente ser um ente finito. Pois, está na alma de Cristo como no seu sujeito. Pois, a alma de Cristo é uma determinada criatura, tendo capacidade finita. Por onde, o ser da graça, não excedendo a capacidade do seu sujeito, não pode ser infinito. — De outro modo, pode ser considerada quanto à essência própria da graça. E então, a graça de Cristo pode ser dita infinita, por não ser limitada; isto é, por ter tudo o que constitui a essência da graça, e não lhe ter sido dada segundo nenhuma medida certa o que pertence à essência da graça, pela razão que, segundo o desígnio da graça de Deus, a quem compete medi-la, a graça é conferida à alma de Cristo como a um princípio universal da gratificação na natureza humana, segundo àquilo do Apóstolo: Ele, nos fez agradáveis a si no seu amado Filho. Como se disséssemos infinita a luz do sol, não por essência, mas, em razão da luz, pois, tem tudo o que pode constituir a essência da luz.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — O dito — O Pai não dá ao Filho o Espírito por medida — num sentido é exposto como referente ao dom que Deus Padre abeterno conferiu ao Filho isto é, a natureza divina, que é um dom infinito. Por isso, uma certa Glosa diz a esse lugar: De modo que tão grande seja o Filho como o Pai. — Noutro sentido, pode referir-se ao dom conferido à natureza humana, de se unir à Pessoa divina, o que também é um dom infinito. Donde o dizer a Glosa, no mesmo lugar: Assim como o Pai engedrou o Verbo completo e perfeito assim, completo e perfeito ele se uniu à natureza humana. — Em terceiro sentido, pode referir-se à graça habitual, enquanto que a graça de Cristo abrange tudo o que respeita à graça. Por isso Agostinho, expondo essa matéria, diz: A medida é uma certa divisão dos dons, pois, a um é dado pelo Espírito a linguagem da sabedoria, a outro a da ciência. Mas Cristo, que dá, não recebeu com medida.

RESPOSTA À SEGUNDA. — A graça de Cristo tem um efeito infinito, quer por causa da infinidade predita da graça; quer por causa d unidade da Pessoa divina, a que estava unida a alma de Cristo.

RESPOSTA À TERCEIRA. — O menor pode aumentando, igualar a quantidade do maior, quando se trata de coisas cuja quantidade é da mesma natureza. Ora, a graça de um homem está para a de Cristo como uma virtude particular para a universal. Por onde, assim como a virtude do fogo, por mais que cresça, não pode igualar à, do sol, assim também, a graça de um homem, por mais que cresça, não pode igualar a graça de Cristo.