Art. 4 ─ Se devemos ter contrição também dos pecados futuros.

O quarto discute-se assim. – Parece que devemos ter contrição também dos pecados futuros.

1. ─ Pois, a contrição é um ato do livre arbítrio. Ora, o livre arbítrio se estende mais ao futuro que ao passado; pois, a eleição, ato do livre arbítrio, recai sobre os futuros contingentes, como diz Aristóteles. Logo, a contrição tem por objeto, antes, os pecados futuros que os passados.

2. Demais. ─ O pecado se agrava pelo seu efeito conseqüente. Por isso Jerônimo diz que a pena de Ario ainda não foi determinada, porque ainda é possível haver quem lhe caia na heresia. E o mesmo se dá com quem é julgado homicida se ferir mortalmente, mesmo antes de o ferido morrer. Mas, nesse tempo intermédio deve o pecador ter contrição do pecado. Logo, não só na sua extensão passada, mas também na futura. E assim, a contrição respeita o futuro.

Mas, em contrário. ─ A contrição faz parte da penitência. Ora, a penitência sempre respeita o passado. Logo, também a contrição.

SOLUÇÃO. ─ Em todos os motores e móveis ordenados, dá-se que o motor inferior além de seu movimento próprio recebe, de certo modo, o movimento do motor superior; tal o que passa com o movimento dos planetas que, além dos seus movimentos próprios, seguem o movimento do orbe primeiro. Ora, em todas as virtudes morais, o motor é a prudência mesma, chamada auriga das virtudes. Por onde qualquer virtude moral, além do seu movimento próprio, se conjuga com o de prudência. Ora, o seu ato próprio recai sobre o seu objeto próprio, que é o pecado cometido. Por isso, o seu ato principal, a saber, a contrição, respeita especificamente só o pecado pretérito. Mas, por consequência, respeita o pecado futuro, enquanto participa do ato adjunto da prudência. E contudo não se move para esse futuro pela sua essência própria e específica. Por isso, quem tem contrição sente dor do pecado passado e se acautela quanto ao futuro; mas não se diz que o pecado futuro é objeto da contrição, mas antes, da cautela, parte da prudência anexa à contrição.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ Diz-se que o livre arbítrio respeita os futuros contingentes, enquanto respeita aos atos; mas não por concernir dos objetos dos atos. Por que podemos, com o nosso livre arbítrio, cogitar das coisas passadas e necessárias; contudo, o ato mesmo de pensar, enquanto cai sob o livre arbítrio, é um futuro contingente. E assim, também o ato de contrição é um futuro contingente, enquanto objeto do livre arbítrio; mas o objeto deste também pode ser o passado.

RESPOSTA À SEGUNDA. ─ Esse efeito consequente, que agrava o pecado, já precedeu em ato, como a causa. Por onde, quando foi cometido, teve a totalidade da sua extensão: e o efeito consequente nada lhe acrescenta essencialmente à culpa. Embora lhe acresça a pena acidental, pois muitos terão razões de sofrer no inferno, pelos muitos males que se lhes seguiram aos pecados. Tal o sentido das palavras de Jerônimo. Por onde não é necessário tenha a contrição outro objeto diferente dos pecados passados.