Art. 3 — Se a caridade é a forma da fé.

(Infra.q. 23, a. 8; III Sent., dist XXIII, q. 3, a. 1, qa 1; De Verit., q. 14, a. 5; De Virtut., q. 2, a. 3)

O terceiro discute-se assim — Parece que a caridade não é a forma da fé.

1. — Pois, um ser se especifica pela sua forma. Logo, de coisas que se dividem por oposição, como espécies diversas de um mesmo gênero, uma não pode ser forma de outra. Ora, a fé se divide da caridade, por oposição, como espécies diversas da virtude1. Logo, a caridade não pode ser forma da fé.

2. Demais. — A forma e o ser a que ela pertence constituem um mesmo sujeito, porque formam um mesmo ente, absolutamente falando. Ora, a fé reside no intelecto, ao passo que a caridade, na vontade. Logo, a caridade não é a forma da fé.

3. Demais. — A forma é o princípio do ser. Ora, o princípio da crença, no concernente à vontade, parece mais ser obediência que caridade, conforme àquilo do Apóstolo (Tm 1, 5): Para que se obedeça à fé em todas as gentes. Logo, a obediência é, mais que a caridade, forma da fé.

Mas, em contrário, todo ser obra pela sua forma. Ora, a fé obra pelo amor. Logo, o amor da caridade é a forma da fé.

SOLUÇÃO. — Como do sobredito se colhe2, os atos voluntários se especificam pelo fim, objeto da vontade. Ora, o princípio da especificação de um ser se comporta, nos seres naturais, ao modo de forma. Portanto, a forma de qualquer ato voluntário é, de certo modo, o fim a que ela se ordena. Seja porque se especifica por este; seja também porque o modo da ação há de, por força, corresponder proporcionalmente ao fim. Ora, é manifesto, pelo que já se disse3, que o ato de fé se ordena ao objeto da vontade que é o bem, como ao fim. E o bem, fim da fé, a saber o bem divino, é objeto próprio da caridade. Logo, a caridade é considerada forma da fé, enquanto que por ela, o ato de fé se aperfeiçoa e informa.

DONDE A REPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — Chama-se a caridade forma da fé por lhe informar o ato. Pois nada impede seja um mesmo ato informado por diversos hábitos; e, portanto, reduzir-se a diversas espécies, numa certa ordem, como dissemos4, ao tratarmos em geral dos atos humanos.

RESPOSTA À SEGUNDA. — A objeção colhe quanto à forma intrínseca. Assim, pois, a caridade não é a forma da fé, senão enquanto lhe informa o ato, como dissemos acima.

RESPOSTA À TERCEIRA. — A obediência mesma, como a esperança e qualquer outra virtude, que possa preceder ao ato de fé, é informada pela caridade, como a seguir ficará claro5. Por onde, a caridade, em si mesma, é posta como forma da fé.
1. 1 Cor 13, 13
2. Ia IIae, q. 1, a. 3; q. 18, a. 6.
3. Q. 4, a. 1
4. Ia IIae, q. 18, a. 7, ad 1.
5. Q. 23, a. 8.