Artigo 7 – Se o temor é o início da sabedoria.

O sétimo discute-se assim. – Parece que o temor não é o início da sabedoria.

1. – Pois, início é o princípio de uma coisa. Ora, o temor não faz parte da sabedoria; porque pertence à potência apetitiva, ao passo que a sabedoria pertence à intelectiva. Logo, parece que o temor não é o início da sabedoria.

2. Demais. – Nada pode ser principio de si mesmo. Ora, o temor de Deus é a mesma sabedoria, no dizer da Escritura. Logo, parece que o temor de Deus não é o início da sabedoria.

3. Demais. – Nada é anterior ao princípio. Ora, é a fé anterior ao temor; pelo preceder. Logo, parece que o temor não é o início da sabedoria.

Mas, em contrário, a Escritura. O temor do Senhor é ó princípio da sabedoria.

SOLUÇÃO. – A expressão – início da sabedoria – pode ser tomada em duplo sentido: como o início da sabedoria mesma, na sua essência, ou quanto ao seu efeito. Assim, o início de uma arte, na sua essência, são os princípios de que ela procede; e o início, quanto ao seu efeito, é o ponto de partida da realização da obra artística. Nesse sentido dizemos que o princípio da arte de edificar é o fundamento, porque por ele começa o construtor a sua obra.

Ora, sendo a sabedoria o conhecimento das coisas divinas, como a seguir se dirá, ela é considerada pelos teólogos e pelos filósofos a luzes diversas. Pois, ordenando-se a nossa vida para o gozo de Deus, por uma certa participação da natureza divina, conferida pela graça, a sabedoria, para os teólogos, é considerada, não só como cognoscitiva de Deus, no dizer dos filósofos, mas também como diretiva da vida humana, dirigida não somente das razões humanas, mas também, das divinas, como claramente o expõe Agostinho.

Assim, pois, o inicio da sabedoria, na sua essência, são os princípios primeiros da mesma, que são artigos de fé. E neste sentido, consideramos a fé o início da sabedoria. Mas, quanto ao efeito, início da sabedoria é o início da sua operação. E neste sentido o temor é o início da mesma; mas, de um modo, o temor servil e, de outro, o filial. O temor servil é como o princípio extrínseco, que dispõe para ela, e nos faz, pelo temor da pena, abandonar o pecado, e assim nos torna capazes para receber o efeito da sabedoria, conforme aquilo da Escritura: O temor do Senhor lança fora o pecado. Por seu lado, o temor casto ou filial é o início da sabedoria, como o primeiro efeito da mesma. Pois, sendo próprio da sabedoria fazer com que a vida humana seja regulada pelas razões divinas, aí devemos ir buscar o princípio da nossa reverência e da nossa submissão para com Deus. E assim, em tudo o mais nos regularemos por Deus.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ­– A objeção mostra que o temor não é o princípio da sabedoria, quanto à essência desta.

RESPOSTA À SEGUNDA. – O temor de Deus está para a totalidade da vida humana, regulada pela sabedoria de Deus, como a raiz, para a árvore. Por isso, diz a Escritura: A raiz da sabedoria é temer ao Senhor, e os seus ramos são de muita dura. Portanto, assim como se diz que a raiz é virtualmente toda a árvore, assim, que o temor de Deus é a sabedoria.

RESPOSTA À TERCEIRA. – Como já dissemos de um modo é a fé o princípio da sabedoria e, de outro, o temor. Donde o dizer a Escritura: O temor de Deus é o princípio do seu amor; mas inseparavelmente se lhe deve ajuntar um princípio de fé.