O problema da migração à luz do profeta Ezequiel

Postado em 20-02-2018

Pe. João Batista de A. Prado Ferraz Costa

Desejaria dar hoje uma modesta contribuição para evidenciar ainda mais a irresponsabilidade e a hipocrisia do chamado “progressismo católico” diante de um dos maiores problemas da atualidade, o problema da migração dos povos do Oriente e da África para a Europa e outras regiões do planeta. Como se sabe, o referido problema afeta principalmente o continente europeu, onde ocorre uma verdadeira invasão, que, além de acarretar distúrbios sociais e outros problemas, compromete a própria identidade cultural de todo o Ocidente que lança suas raízes mais profundas no catolicismo romano.

Há bons autores que afirmam que o problema da migração (na verdade, invasão) é algo programado por um dos mais importantes ideólogos da União Europeia, NiKolaus Kalergi, que disse que a imigração em massa é necessária para dominar os povos e controlar os Estados.

É inegável que em uma Europa secularizada, sob uma liderança política e religiosa que não tem mais nenhum compromisso com a defesa da fé e dos valores cristãos, a minoria católica que restar firme na fé terá muito que sofrer por parte dos islâmicos invasores. Absolutamente não procede o discurso que defende a distinção entre o fundamentalismo islâmico e o Corão. Basta comparar a vida e os ensinamentos de Nosso Senhor Jesus Cristo com a vida de Maomé. Nosso Senhor morreu na cruz pedindo que o Pai perdoasse aos seus inimigos algozes. Maomé promoveu mais de 60 guerras.

Fica patente a hipocrisia do progressismo católico em sua arenga em defesa da imigração-invasão quando seus ativistas e ideólogos apelam para a Sagrada Escritura e para o direito natural para justificar a  perigosa invasão. Realmente, como podem argumentar com citações bíblicas, principalmente com passagens do Antigo Testamento, para defender a migração (como se acreditassem em um direito divino à migração) aqueles que não creem na inspiração das Escrituras e a reduzem a uma coletânea de fábulas e cosmogonias antiquíssimas ricas em mitos, anteriores a Moisés? Como podem apelar para um direito natural ao deslocamento dos povos aqueles que são relativistas e reduzem toda moral a um fenômeno cultural fruto da pressão social sobre a conduta individual?

E o pior da hipocrisia desses ativistas e ideólogos do progressismo católico é que são capazes de, contraditoriamente, negar aos venezuelanos, que querem fugir do inferno socialista bolivariano, o direito à emigração, porque consideram a Venezuela como um modelo de realização do Reino de Deus na terra.

Aquela excelente edição da vulgata latina traduzida  pelo Pe. Antonio Pereira de Figueiredo, publicada nos anos cinquenta em 17 volumes, com notas explicativas de grandes exegetas, tem um comentário notável sobre uma das passagens mais obscuras do livro do profeta Ezequiel, uma passagem sobre a qual  Doutor Máximo São Jerônimo preferiu guardar silêncio. Trata-se dos capítulos 47 e 48, referentes à repartição da Terra Santa e ao templo de Jerusalém. O profeta diz, em linguagem muito difícil de entender, como seria a vida civil e religiosa de Israel após  cativeiro da Babilônia. E refere-se à divisão das terras, dizendo no versículo 22 do capítulo 47: “E vós a sorteareis para vossa herança, juntamente com os estrangeiros, que vierem ajuntar-se convosco, que tiverem filhos no meio de vós: E vós os tereis como naturais entre os filhos de Israel: Repartirão convosco a herança no meio das tribos de Israel.”

A nota explicativa dos citados versículos é interessantíssima porque diz que tal repartição das terras e o modo com que Deus no capítulo seguinte a delineia nunca foram  executados pelos judeus tornados de Babilônia ao seu país. Logo ela, ainda tomada á letra, não é senão uma figura da tornada de toda a nação hebreia à herança da fé e da justiça que ela perdeu. A nota acrescenta a seguir que nada do que diz o profeta Ezequiel convém a uma cidade material nem a uma partilha sensível do pequeno país entre o Jordão e o mar, que uma só tribo bem unida era capaz de encher. E diz ainda que nada é mais próprio para significar a geral conversão de todos os judeus: o seu igual ardor pela fé, o seu igual empenho por entrar na Igreja, o igual cumprimento das promessas feitas a favor deles a Abraão.

E, na minha opinião, se o texto sagrado tem o sentido que  razoavelmente lhe dá a nota explicativa, o que o profeta diz sobre a acolhida dos estrangeiros na Terra Santa se pode aplicar à conversão dos gentios à unica religião verdadeira, a Santa Igreja Católica.

É claro que existe um direito natural à migração dos povos em busca de uma melhoria de condições de vida. É um direito natural e divino, decorrente da destinação universal dos bens da criação. Várias passagens da Sagrada Escritura o inculcam. Mas assim como da destinação universal dos bens não deriva um regime comunista com a abolição do direito de propriedade privada, assim também não deriva um governo mundial com a consequente destruição das nações. É um direito a ser exercido dentro da lei e segundo as regras da prudência política, como observa Aristóteles na sua Política.

Ademais, a todo direito corresponde um dever. Ao direito de migrar corresponde, entre outros, o dever de respeitar as leis do país acolhedor e um esforço sincero para integrar-se em seu ambiente cultural. Pio XII, em sua mensagem comemorativa da encíclica Rerum Novarum de 1941, disse: “Se ambas as partes, a que permite deixar a terra natal e a que recebe os recém-chegados, se mantiverem lealmente solícitas em eliminar quanto possa impedir a formação e desenvolvimento de uma verdadeira confiança entre o país de emigração e o país de imigração, todos auferirão vantagem de tal mudança de lugares e de pessoas.”

Mas infelizmente não é isto o que se observa atualmente em vários países da União Europeia. De uma parte há o conhecido perigo do terrorismo islâmico e um projeto de dominação política do maometismo. De outra parte, a inépcia de uma União Europeia incapaz de lidar com um problema que no fundo é de natureza religiosa. Sua concepção materialista da vida, sua pretensão de impor a toda a sociedade uma verdadeira ditadura laicista a impede de ver as consequências últimas do plano diabólico de Nikolaus Kalergi.

Para remate destas considerações em torno de um problema que angustia a todos que amam a velha Europa e tudo que ela significa para a nossa fé e nossa civilização, volto à  Bíblia do Pe. Antonio de Figueiredo. A primeira nota do capítulo 48, sobre a divisão da Terra Santa pelas doze tribos de Israel que Ezequiel profetiza, diz que tal divisão, segundo os milenaristas, se cumprirá no fim do mundo.

Ora, o progressismo católico, especialmente os adeptos da teologia da libertação, sonha com algo semelhante aos milenaristas. A Igreja Católica seria sucedida por uma nova religião mundial, que seria um amálgama de todas as tradições espirituais da humanidade, em uma nova terra onde todas as fronteiras, cercas e divisas seriam abolidas.

É por isso que a Igreja modernista só quer o diálogo inter-religioso, não quer a conversão dos gentios à fé católica (muito menos ainda conversão dos judeus), e deturpa a profecia de Ezequiel.

Como se pode ver, esses hereges são capazes de transformar a Palavra de Deus em palavra do demônio. E toda grande questão política é, no fundo, uma questão religiosa.

Anápolis, 20 de fevereiro de 2018.