Francisco, a moral familiar e a vida morta dos tradicionalistas

Postado em 05-08-2022

Pe. João Batista de A. Prado Ferraz Costa

Tendo em vista os fortes rumores em torno de uma revisão da doutrina constante da Igreja sobre a paternidade responsável que autorizaria o uso de métodos artificiais de controle da natalidade, tendo em vista, também, os ataques soezes  do bispo de Roma contra os católicos tradicionalistas ( que, na sua opinião, seriam uns retrógrados que querem andar para trás e não acompanhar a vida da Igreja, que seriam a bem dizer uns “cadáveres ambulantes”), julgo-me no dever de dar aos fiéis da Capela Santa Maria das Vitórias uma orientação, porque há, realmente, muitos católicos perplexos, como dizia Dom Lefèbvre.

Há muita coisa a ser dita a respeito. Vou limitar-me a poucas considerações.

Em primeiro lugar, é preciso reconhecer que, infelizmente, o papa Francisco tem o seu caminho bem aplainado para a sua empreitada de uma revisão da moral familiar, que, na verdade, será aplaudida pela imensa maioria dos católicos “praticantes” que já há anos fazem uso dos mais diversos métodos contraceptivos e vão à missa, comungam e participam da vida da Igreja. Ademais, será fácil, para Francisco, justificar sua decisão: poderá dizer que, assim como a Igreja no Vaticano II abandonou a sua doutrina multissecular sobre a tolerância religiosa e adotou a doutrina antes condenada da liberdade dos cultos, assim como abraçou o ecumenismo antes severamente condenado por Pio XI na encíclica Mortalium animos, assim como o catecismo “amarelinho” de João Paulo II reviu a doutrina da Igreja sobre a pena de morte, assim também ele, Francisco, pode reformar uma doutrina que não passa de uma letra morta para a consciência da imensa maioria dos católicos aggiornati reformados pelo espírito e pela letra do Concílio Vaticano II. Francisco poderá dizer igualmente que fundamenta sua decisão de rever a doutrina sobre o uso dos contraceptivos na declaração Gaudium et spes do Concílio Vaticano II, a qual não reafirma a doutrina tradicional sobre a hierarquia dos fins do matrimônio.

Na realidade, salta aos olhos de qualquer bom observador que não houve nenhum empenho por parte da autoridade eclesiástica na defesa da doutrina tradicional sobre a paternidade responsável reafirmada pela encíclica Humanae vitae do papa Paulo VI (O qual papa, segundo se diz, publicou a citada encíclica, movido não tanto por uma convicção pessoal, mas por influência dos prelados mais conservadores  que naqueles tempos ainda existiam na Cúria Romana).

Com efeito, ao mesmo tempo em que, de Roma, os papas faziam discursos e exortações em defesa da moral familiar, nomeavam bispos e cardeais que abertamente, os contradiziam. Quantos relatos ouvimos de que nos famigerados cursos de noivos se defende publicamente o uso de contraceptivos dentro do matrimônio? E não me consta que fossem tomadas medidas disciplinares contra a heresia. Só assim se explica que hoje tenhamos Bergoglio como papa.

Para Francisco, a Igreja tradicional que adotava como sua teologia própria a escolástica e entendia que a verdade não muda mas é sempre determinada e fixa, em virtude de uma adequação do intelecto com o dado da Revelação, a Igreja que entendia que a doutrina do catecismo passava do intelecto para o coração, esta Igreja está morta e sepultada, pois o que importa é adequar-se à realidade vivida nas situações mais diversas do dia a dia. Para Francisco, não há necessidade de afirmar uma continuidade doutrinária entre o que a Igreja sempre creu e ensinou e o que diz hoje, não há necessidade de uma coerência lógica. Daí a insistência de Francisco naquilo que ele chama de soluções pastorais. Daí seu apreço pela “cultura do encontro”. Para ele, quem fala primeiro ao homem não é a razão, mas o coração. De maneira que Francisco jamais conceberá que um casal se prive da alegria de um ato conjugal expressão do seu amor em razão de um princípio doutrinário abstrato. É o sentido  de Amoris laetitia. É por isso que, no começo do seu pontificado, ele apodou de “coelhos” as senhoras católicas mães de muitos filhos. Para ele, essas mulheres põem em prática um princípio doutrinário desconexo com a realidade. São mulheres que vivem em outro mundo.

Mas está claro que não podemos deixar-nos enredar por esses sofismas da filosofia moderna e da nova teologia condenada por Pio XII na encíclica Humanae generis. Professamos nossa fé em Cristo verdade eterna, cujas palavras jamais passarão. O pecado será sempre pecado, a virtude sempre virtude. O sexto mandamento da lei de Deus não muda. O uso de contraceptivos na vida conjugal abre as portas da família cristã, que deve ser um santuário, para todo tipo de imoralidade e relaxamento. Que autoridade moral terão os pais para ensinar seus filhos a dominar suas paixões na juventude se eles mesmos vivem na luxúria? Uma família casta vive uma vida ordenada, tranqüila, merece todas as bênçãos e graças do céu para educar bem seus filhos no caminho do bem para um dia merecerem a glória da vida eterna.

Rezemos pela conversão dos pecadores, guardemos a fé, continuemos firmes na tradição imutável da Igreja.

Anápolis, 5 de agosto de 2022.

In dedicat. Sanctae Mariae ad Nives